
"Admito que naquele momento, assustou um pouco [risos]". Foi assim, com a sinceridade de quem ainda está absorvendo a virada na carreira, que Maykon Jesus descreveu a sensação de entrar em campo pelo Vitória.
Aos 19 anos, o lateral-esquerdo alagoano não esperava que sua estreia como titular viria assim: de repente, sem aviso, e em um confronto difícil contra o Cruzeiro, no Barradão. Até então, havia sido recém-promovido à segunda opção, após a saída de Hugo, que tomou rumo ao futebol árabe. O jovem ainda ficava atrás de Jamerson, titular absoluto, que começou aquela partida, disputada no último 12 de junho.
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O gramado da casa do Leão estava encharcado. Naquela noite chuvosa em Salvador, os dois times faziam um jogo duro. A água atrapalhava a condução da bola, forçando os atletas a recorrerem a lançamentos longos e cruzamentos.
Para piorar um contexto já complicado, Eduardo, do Cruzeiro, travou o tornozelo de Jamerson numa entrada violenta. O meia acabou expulso e o lateral do Vitória teve que ser retirado de campo de maca, sentindo muitas dores.
A substituição não estava nos planos, mas ali, ao final do primeiro tempo, o número 66 apareceu na placa de substituição: era o número na camisa de Maykon. Mesmo assustado, o jovem entrou em campo sob chuva, com o Barradão tenso e um Cruzeiro que, apesar de estar com um a menos, ainda era perigoso.
"Não imaginava que a oportunidade viria naquele momento. Claro que existe uma pressão, mas eu sempre tive uma cabeça muito boa. O apoio da torcida fantástica e do Carpini tornaram o momento um pouco menos tenso", explicou o lateral.
Era a chance que ele esperava. Uma oportunidade que veio não da forma que imaginava. E ele sabia: precisava agarrar.

A trajetória
Natural do Pontal da Barra, tradicional bairro de pescadores e rendeiras em Maceió, Maykon cresceu longe dos holofotes do futebol alagoano. Apesar da paixão pelo esporte desde cedo, nunca participou das categorias de base dos maiores times de Alagoas. Foi há quase 270 quilômetros de casa, em Camaragibe, Pernambuco, que recebeu a primeira oportunidade real. Ainda adolescente, chegou à base do Retrô, onde começou a moldar o lateral-esquerdo ofensivo.
O desempenho no clube pernambucano logo chamou a atenção do Atlético-MG, que decidiu apostar no jovem. Em Belo Horizonte, Maykon passou a integrar as categorias de base de um dos clubes mais estruturados e tradicionais do País, onde teve contato direto com uma nova rotina profissional, com a exigência de um grande clube como o Galo. Observava de perto nomes como Guilherme Arana e Rubens, referências na posição.
"Aprendi bastante. Eles serviram de inspiração, claro. Foi um privilégio poder observar os dois (Arana e Rubens) de perto, além de manter um contato com eles. Até hoje converso com ambos, peço dicas [risos]".
Apesar de não ter sido promovido ao time principal, o Galo manteve o atleta sob contrato e optou por emprestá-lo.
Foi então que, no início de 2025, Maykon chegou ao Noroeste carregando dúvidas. A falta de rodagem e o fato de ainda não ter recebido uma chance no profissional pesavam na mente do jovem lateral-esquerdo.
"No começo, eu tinha muitas dúvidas. A gente que é atleta se questiona muito, e eu me perguntava se ia dar certo. Mas, como disse antes, sempre tive uma cabeça muito boa. Tratei a proposta como mais uma oportunidade e veio a ser mais uma pela qual sou muito grato".
Pela primeira vez como profissional, em um campeonato estadual que, segundo o próprio Maykon, é o mais disputado do País, ele vestiu a camisa do Noroeste no Paulistão de 2025. Estreou contra o Velo Clube e rapidamente conquistou a titularidade na lateral esquerda. Em 11 jogos, sendo 10 como titular e somando 898 minutos em campo, foi um dos principais destaques da equipe. Com duas assistências, foi eleito duas vezes o melhor lateral da rodada e figurou no time ideal da competição em quatro oportunidades.

Em abril de 2025, desembarcou em Salvador para mais um contrato por empréstimo, desta vez, com o desafio de se firmar em uma equipe da Série A, em um calendário mais exigente e sob os olhos de uma torcida apaixonada.
Mas a realidade inicial ainda foi de espera. Com Hugo, emprestado pelo Botafogo, e Jamerson à frente na hierarquia da posição, Maykon mais uma vez se viu sem oportunidades. Esteve no banco durante quatro jogos, incluindo o clássico contra o Bahia, na Arena Fonte Nova, onde teve o primeiro contato com uma das maiores rivalidades do País.
A espera para viver algo do tipo — dessa vez atuando em campo — não duraria muito. Poucas semanas depois, Hugo retornou ao Botafogo após o fim do contrato de empréstimo e, logo em seguida, foi negociado com o Al Wasl, dos Emirados Árabes. A movimentação abriu uma vaga na lateral esquerda, promovendo Maykon à segunda opção no elenco.
Assim, tão rápido quanto veio a subir na hierarquia da posição, também se viu como a primeira e, naquele momento, única alternativa. Agora, com a lesão de Jamerson e vindo de atuação sólida na sua estreia, Maykon Jesus é o único lateral-esquerdo disponível para o técnico Thiago Carpini no duelo com o Confiança, pela Copa do Nordeste. A expectativa é iniciar como titular e, para ele, cada jogo é uma oportunidade que precisa ser tratada como um passo na direção certa.
"Às vezes, a chance não vem da forma que esperamos. Eu mesmo não imaginava que a oportunidade viria ali, naquele momento. Mas toda oportunidade é uma oportunidade e deve ser aproveitada como qualquer outra. Graças a Deus, pude entrar em campo e cumprir meu papel", disse.
Para quem saiu do Pontal da Barra sem passagem pelos clubes locais e cruzou estados do Nordeste ao Sudeste em busca de espaço, vestir a camisa do Vitória como titular em uma competição regional é mais que um triunfo: é uma resposta. E, talvez, apenas o começo de uma nova fase.
Como diz a clássica canção “Don’t Stop Believin” (Não pare de acreditar – da banda Journey), é preciso segurar firme no sentimento. Para Maykon, acreditar é o que o trouxe até aqui — e é o que o move para seguir.