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Prestes a lançar livro, Alexandra Gurgel fala sobre autoaceitação, relacionamento abusivo e namoro com publicitária

Em "Comece a se amar", influenciadora carioca propõe exercícios de autoestima e debate a indústria da beleza

O corpo de Alexandra Gurgel é como um mapa de sua existência. Por baixo do top cropped e do short jeans que ela veste, numa tarde de sexta-feira, no Rio, estão as marcas da cânula de uma lipoescultura, que a deixou “com as formas de Kim Kardashian”, aos 23 anos. Há também as curvas de uma anatomia real, exibida diariamente para mais de um milhão de seguidores no Instagram, quase dez anos depois da cirurgia. Espalhadas sobre a pele, tatuagens completam a cartografia com mais nuances da história da influenciadora carioca, dona do perfil @alexandrismos. A primeira delas, feita no braço esquerdo, retrata o próprio corpo nu. Foi com esse desenho que Alexandra ganhou coragem para exibir os braços pela primeira vez. A lista se estende por uma imagem da “Lua em Leão”, um terço convertido no símbolo do feminismo e uma combinação de duas palavras entre os seios que resume o seu maior legado em 32 anos de vida: “corpo livre”.

É assim que se chama o movimento fundado por ela, dedicado a libertar diferentes pessoas da clausura involuntária imposta pelo que se convencionou como padrão de beleza. Um trabalho que se desdobra em seus perfis nas redes sociais, vídeos no YouTube e uma trilogia de livros, cuja segunda parte será lançada ainda este semestre. “Comece a se amar” é a sequência do bem-sucedido “Pare de se odiar” (ambos da editora Record), publicado em 2018. A nova obra traz relatos pessoais e dados sobre a maneira como pessoas do mundo inteiro se relacionam com as suas aparências. Também reserva espaço para exercícios de autoestima, como “peça para três pessoas falarem cinco qualidades suas”.

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A ideia, segundo Alexandra, é ajudar os leitores a avançar, um dia de cada vez, na busca por uma boa relação com o corpo. “Com a nossa imagem, tem que ser assim. Vamos nos olhando um pouquinho mais no espelho, pensando: ‘Hoje vou lidar com as minhas estrias’; ‘desta vez, com as celulites’; ou ‘não vou lidar com nada porque não estou me sentindo bem’”, descreve. “Há dias e dias. Em alguns, estamos com a mesma cara e o mesmo dinheiro no banco, mas nos sentimos lindas. Em outros, horríveis.”

Foi assim com Alexandra. A primeira advertência sobre o seu corpo veio de um endocrinologista, quando ainda tinha 9 anos. Durante a consulta, o médico disse que, se continuasse gorda, ninguém gostaria dela. “Entendi que era feia e precisava ser magra para me tornar interessante”, recorda-se. Dali em diante, vieram as dietas, os medicamentos pesados e as piadas autodepreciativas, até obter o corpo “ideal” com a tal lipoescultura. Três meses depois da cirurgia, a jovem entrou em depressão, ao perceber que era desejada somente pela aparência, e não pela personalidade.

O baque foi tão grande que Alexandra se intoxicou para tentar tirar a própria vida. Por sorte, foi socorrida e, deste renascimento, veio uma nova visão de mundo, enriquecida por sessões de análise e leituras de obras escritas por autoras feministas. “Foi muito difícil entender como cheguei àquele ponto. Mas me deu força também porque, depois disso, passei a enxergar cada vez mais motivos para estar viva”, diz. “Eu comecei a me odiar aos 9 anos e parei aos 26.”

Compartilhar histórias do tipo em suas redes faz com que a influenciadora estabeleça uma identificação profunda com o público. Autora do livro “Se a carapuça serviu — A cultura das indiretas e a violência simbólica no Facebook”, Letícia Schinestsck fez uma tese de doutorado sobre o movimento body positive, surgido no exterior, e reconhece Alexandra como pioneira do tema no Brasil. “Até 2015, você abria o Instagram e só tinha foto de suco verde e blogueira mostrando a rotina de malhação”, lembra. Mas, segundo Letícia, a carioca introduziu o assunto na vida dos brasileiros sob uma interpretação bastante peculiar. “Eu, particularmente, tenho um pouco de ressalvas a esse discurso de positividade, porque não é fácil se amar de uma hora para outra. Às vezes, não me odeio, mas também não me amo. Então, acho que a maior contribuição de Alexandra foi justamente criar essa expressão ‘corpo livre’, que não nos condiciona a um sentimento negativo ou positivo.”

Durante a pesquisa da tese, Letícia abria as caixas de comentários sob as postagens de Alexandra e lia as milhares de mensagens depositadas por lá. Descobriu, assim, que uma verdadeira rede de apoio estava se formando. “Lembro-me do relato de uma menina sobre ter sido ofendida por um cara no Tinder, por causa da sua aparência. Fiquei tocada e a convidei para uma conversa particular. Ela me contou que isso a fez pensar em se matar”, relata.

Por outro lado, o papo-reto de Alexandra também faz com que ela seja julgada por alguns como detentora de um discurso demasiado impositivo. Ela refuta a interpretação. “Quando falo sobre o caso de uma menina com o nariz aberto depois de uma rinoplastia, acham que estou criticando quem opta por esse tipo de cirurgia. Mas não é isso. Proponho uma reflexão sobre o que está por trás desses episódios”, argumenta. Ela lembra que, nos últimos dez anos, segundo dados divulgados em 2019 pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, houve um aumento de 141% nos procedimentos em jovens de 13 a 18 anos. “O Instagram completou uma década em 2020. Ou seja, a rede e o culto a figuras como Kim Kardashian certamente têm a ver com isso, embora não possamos esquecer que o movimento Corpo Livre também nasceu por lá.”

O confinamento trazido pela pandemia, ela diz, fez com que o interesse por esse tipo de debate aumentasse ainda mais. A análise é corroborada por Luciana Bazanella, co-fundadora e sócia da agência especializada em tendências White Rabbit. “Enquanto precisamos nos preocupar em estar vivos, as pessoas não querem mais se prender a estruturas opressoras e padronizantes, que se dissolvem conforme novos discursos emergem”, avalia.

Um dos indicativos usados por Alexandra para mensurar essa relevância é o número de famosas que começaram a segui-la nos últimos meses. Tatá Werneck é uma delas. “Não conheço nenhuma mulher que não tenha questões com o corpo”, desabafa a atriz. “O padrão é cruel com quem quer atingi-lo a qualquer custo e com quem, teoricamente, faz parte dele. É uma tortura para todos. Corpos são livres e legítimos do jeito que são. Alexandra fala muito sobre isso.” Ela afirma ter encontrado na influenciadora um convite à liberdade. “Vi uma mulher sendo livre de verdade nas redes. Ela faz close da bunda, dança de biquíni e sorri para caramba. Fala sobre como já sofreu e como se libertou. Eu me encantei.”

Quem acompanha Alexandra invariavelmente esbarra com assuntos que vão muito além da gordofobia e da aceitação. Tocada pela maneira como foi conduzida a investigação de um estupro contra a influenciadora Mari Ferrer, no ano passado, ela decidiu contar como se deu conta de que sofreu o mesmo tipo de violência durante a sua “primeira vez”, aos 18 anos. “Estávamos eu e meu ex-namorado abraçados, dentro do mar. Quando vi, estava sendo penetrada, sentindo dor, e ele só disse: ‘Cala a boca’. Durou três minutos e, ao final, o ouvi falar: ‘Viu? Agora, você é mulher”, conta. “Só entendi o que se passou anos depois, quando conheci o termo relacionamento abusivo. Eu me senti muito mal com isso, mas estava começando a vida, e ele era seis anos mais velho. Eu era muito vulnerável naquele momento.”

O namoro terminou, mas o trauma a acompanhou por anos. Nas descobertas que o destino lhe reservou, porém, o espaço para um amor genuíno, personificado pela publicitária Carol Caixeta, estava bem guardado. “Antes de me descobrir lésbica, tentei curar a ferida com homens, porque me achava hétero. Também fiquei mais de oito anos sem transar, por questões religiosas (na juventude, Alexandra cogitou ser freira) e por sentir medo”, relata.

A nova vida afetiva exala carinho e cumplicidade. No ano passado, Alexandra e Carol decidiram trocar a casa onde viviam, em São Paulo, por uma nova morada, numa cidade satélite de Brasília, vizinha à Chapada dos Veadeiros. Com um enorme quintal e uma vista sem barreiras para o céu do Cerrado, Alexandra, que é jornalista e começou a vida profissional como assessora de imprensa, segue se reinventado a cada dia. “Desde que me mudei para lá, minha criatividade triplicou”, comemora. Não por acaso, a lista de projetos futuros é robusta. Tem a tradução de um livro infantil, o lançamento de um site dedicado a temas como corpo e autoestima e a conclusão da trilogia, que deve ser casada com um documentário sobre o mesmo tema. Se o corpo é livre, a mente também é. “Não é que eu tenha orgulho de ser gorda e pense: ‘Vamos todo mundo ser gorda’. Tenho orgulho de ser quem eu sou."

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