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HOME > notícias > CONCURSO E EDUCAÇÃO

Em dez anos, Lei de Cotas já garantiu a inserção de quase 40 mil estudantes em Alagoas

Pretos, pardos, indígenas, quilombolas e estudantes da rede pública têm conquistado o lugar deles nas salas de aula e mudado a realidade deles e de suas famílias

Dez anos após a implantação da Lei de Cotas no Brasil (Lei 12.711, de 2012), completados nesta segunda-feira (29), a mudança no cenário das universidades públicas e institutos federais de todo o país é nítida. Pretos, pardos, indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência passaram a ocupar seus espaços nas salas de aula do ensino superior e a conquistar o tão sonhado diploma, algo muito distante até então. Somente em Alagoas, cerca de 40 mil estudantes já ingressaram nas instituições de ensino por meio da lei, que tem garantido a inclusão, a democratização e a diversificação dos cursos técnicos e superiores.

A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) é uma das pioneiras na implantação de ações afirmativas e no cumprimento das Cotas no país. Antes mesmo de a lei entrar em vigor, ainda em 2003, a instituição de ensino já discutia e aprovava, por meio do Conselho Universitário (Consuni), um recorte de cotas para estudantes de escolas públicas, dentro de um recorte racial. Havia também a questão de gênero, sendo 60% das vagas para mulheres e 40% para homens. Atualmente, com a lei já consolidada, há a destinação de 50% das vagas ofertadas nos cursos da Ufal para os cotistas.

“Foi importante ter saído como uma das instituições pioneiras porque fomos preparando o terreno, avaliando e aprimorando a política de ações afirmativas na Ufal. Com a Lei de Cotas, conseguimos dar mais corpo e impulsionar mais o sistema de avaliação das políticas. A gente consegue hoje, após todos esses anos, perceber que a cara da universidade mudou significativamente. Hoje temos negros, quilombolas e indígena em cursos como Medicina e Direito. Muitos deles já formados e contribuindo com a sociedade. A lei precisa ter continuidade para que possamos erradicar alguns problemas estruturais do Brasil”, afirma o coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) da Ufal, professor Danilo Marques.

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Além da Ufal, o acesso aos cursos do Instituto Federal de Alagoas (Ifal) também podem se dar por meio das cotas. O Ifal, inclusive, é o único do país a extrapolar o percentual que está na lei e ofertar, no mínimo, 70% das vagas existentes no ensino médio/técnico e superior para os cotistas. De 2012 para cá, a estimativa é a de que mais de 20 mil alunos ingressaram nos cursos disponíveis por meio das cotas.

Para o chefe do Departamento de Seleção de Ingressos, Eduardo Frigoletto, as cotas permitiram a diversificação dos discentes em sala de aula. “O Ifal é o único instituto do Brasil que adota 70% de reserva de vagas mínima. Se não fossem as cotas, haveria um maciço ingresso de candidatos da Ampla Concorrência em detrimento dos alunos egressos de escola da rede pública”, afirma, destacando que, em Alagoas, mais de 85% dos alunos do Ensino Médio e do Ensino Superior são oriundos de escolas públicas de acordo com o Censo Escolar.

Para Danilo Marques, as ações afirmativas são fundamentais para diminuir a exclusão social e outros problemas arraigados na sociedade brasileira. “As Ações Afirmativas nas instituições públicas têm como resultado a diminuição da exclusão social, da segregação racial, da concentração de renda e de tantos outros problemas sociais que possuem como uma de suas principais causas o preconceito racial”, pontua.

Ufal destina 50% das vagas ofertadas para estudantes cotistas
Ufal destina 50% das vagas ofertadas para estudantes cotistas | Foto: Ailton Cruz

Ele é responsável por uma pesquisa que está em andamento e que pretende avaliar a política de cotas na Universidade, considerando os últimos dez anos. O Censo de Ações Afirmativas da Ufal já levantou, em sua etapa concluída, o número de vagas disponibilizadas e o quantitativo de ingressantes nos cursos pela Lei de Cotas, além da distribuição por cursos.

Desde 2012, quando houve a promulgação da lei, mais de 18 mil estudantes ingressaram na Universidade Federal de Alagoas por meio do sistema de cotas, sendo a maioria deles no campus A.C.Simões, que, por estar situado na capital alagoana, oferta uma maior quantidade de vagas por cursos. Entre os anos de 2013 e 2017, por exemplo, o campus de Maceió matriculou 18.398 estudantes, sendo 8.670 deles negros (pretos e pardos) e indígenas, atingindo 47% do total de vagas ofertadas.

Em Maceió, os cursos do Centro de Educação lideram o ranking de cursos com maior presença de cotistas desde 2013, incluindo, quando aplicada, a análise de proporcionalidade, que analisa a porcentagem de cotistas equivalente ao número de matrículas gerais de cada curso. Somados, os três cursos de Pedagogia do A.C. Simões - matutino, vespertino e noturno - disponibilizaram 240 vagas por ano, sendo 80 para cada curso entre 2013 e 2021, totalizando 2.160 vagas.

Na área de Exatas do Campus A. C. Simões, o que possui a maior presença de cotistas é o de Química Licenciatura Plena Noturno, que dispõe de 70 vagas por ano, totalizando 630 vagas desde 2013, mantendo uma média de 45% de cotistas matriculados dentro da análise de proporcionalidade. A presença masculina é maior que a feminina em todos os cursos do Instituto de Química. No caso do curso de Química Licenciatura Plena Noturno, a diferença atinge uma média de 20 matrículas a mais para cotistas do sexo masculino.

O campus de Arapiraca matriculou 9.248 estudantes desde 2013, e os cursos com maior número de ingressantes são: Ciência da Computação (548 estudantes), Ciências Biológicas (544 estudantes), Matemática (533 estudantes), Serviço Social (527 estudantes), Administração (517 estudantes), Física (513 estudantes), Zootecnia (509), (Agronomia (552 estudantes), Química (488 estudantes) e Engenharia de Pesca (469 estudantes). Aplicando o recorte de ingressantes cotistas, o curso que lidera o ranking é Serviço Social (Unidade Palmeira dos Índios), que, com cerca de 57 matrículas gerais ao ano, atingiu 49% de estudantes cotistas. Em segundo lugar, está o curso de Matemática Licenciatura, com média de 55 matrículas gerais ao ano, também atingindo 49% de estudantes cotistas. Ciências Biológicas Diurno, com uma média de 55 matrículas gerais ao ano, atinge cerca de 45% na análise de proporcionalidade.

A pesquisa também está avaliando a questão da evasão dos estudantes cotistas. Diante dos cortes orçamentários sofridos pelas universidades públicas nos últimos anos, com a redução do número de bolsas estudantis disponibilizadas, o que pode-se perceber é a desistência de alunos dos períodos diurnos - manhã e tarde - ou de cursos em período integral.

“Percebemos que os alunos em geral tendem a evadir dos cursos que são no período diurno ou cursos integrais. Isso significa que muitos estudantes saem por conta da necessidade de trabalhar durante o dia. E aí a importância de ter cursos noturnos e de defender a assistência estudantil. A Ufal tem sofrido bastante com o corte de bolsas. Nos últimos anos, houve cortes muito grandes no orçamento universitário vindos do Governo Federal e isso vai impactar diretamente na política de cotas e na permanência dos estudantes. Não só dos cotistas, mas os de ampla concorrência também. Ficamos pouco mais de 2 anos sem ofertar bolsas para os estudantes indígenas e quilombolas, a chamada Bolsa Permanência, que é no valor de 900 reais. Recentemente, essas bolsas voltaram, mas foi dado um quantitativo pequeno, que não abarcou os cotistas quilombolas e indígenas. É preciso entender o quanto é importante a política de assistência estudantil, o quanto é importante pensar em políticas de permanência desses alunos na universidade”, afirma o professor Danilo.

O jornalista Hebert Borges, de 26 anos, é uma das pessoas beneficiadas pela Lei de Cotas na Ufal. Ele conseguiu acesso à universidade no primeiro ano em que a legislação entrou em vigor. Negro e estudante da rede pública durante todo o Ensino Médio, ele foi o primeiro da família a ingressar e concluir um curso superior, rompendo um ciclo que se repetia, durante toda a história, no seu entorno.

“Ninguém na minha família antes de mim tinha ingressado numa universidade, seja pública ou privada. Era algo utópico. Tanto que, na época dos meus pais, quem concluía uma graduação era ‘doutor’. Hoje, é algo tão presente na vida das pessoas, que se tornou, como deve ser, mais uma fase na vida de estudos da pessoa e não algo fora da realidade. Até para o contexto geral da sociedade, a universidade hoje é algo muito mais comum na vida cotidiana. A gente saiu daquela Ágora grega para um ambiente de formação dos cidadãos, de todos os cidadãos”, conta Hebert.

Quando questionado se a Lei de Cotas mudou os rumos da vida dele, a resposta é simples e direta: “radicalmente”. Para ele, muito mais que isso, a legislação é a prova de que, muitas vezes, falta apenas a oportunidade.

“É comum que os filhos trilhem pelo caminho profissional dos pais e isso é perfeitamente salutar e louvável. Porém, há uma esparrela nessa crença. Ela perpetua o mesmo extrato social para sempre. Quebrar esse ciclo é oxigenar a sociedade, e foi isso que a Lei de Cotas fez. Minha família é de agricultores e prestanistas, esse vendedores de porta em porta, e é assim há gerações. Muito trabalhadores, porém, sempre sobrevivendo, sem um mínimo de conforto. Graças às cotas, eu consegui adentrar na Ufal e contrapor uma ideia errônea que as pessoas têm de que a Lei de Cotas fez com que pessoas sem conhecimento ou sem mérito entrassem na universidade. Isso é uma grande mentira. A Lei de Cotas tornou igualitário o acesso ao ensino superior, tratando os desiguais de forma desigual, para torná-los iguais aos outros. Eu sou a prova de que essas pessoas têm um raciocínio errado porque me formei um profissional igual a todos os meus colegas, cotistas ou não. Isso é a prova de que o que falta, para muitos, é a oportunidade”, afirma Hebert.

Mais que a inclusão, o jornalista considera que as cotas são essenciais para romper com ideias enraizadas na sociedade. “A Lei de Cotas é uma ferramenta de ruptura. Você rompe com a ideia de que o filho de empregado vai ser empregado do filho do patrão. Ela oferece, a todas as pessoas, o acesso às mesmas condições para que, aí, elas possam competir de forma igualitária quando chegam ao mercado de trabalho. Nele sim, cada um entra pelo seu mérito”, pontua.

Jorgge é aluno cotista da Ufal e fala sobre a importância da lei
Jorgge é aluno cotista da Ufal e fala sobre a importância da lei | Foto: Ailton Cruz

O universitário Jorgge Nichollas Costa de Amorim, de 32 anos, que cursa atualmente o 5º período de Arquitetura e Urbanismo na Ufal, é também um aluno cotista que o ensino superior ganhou. Natural de Palmeira dos Índios, ele estudou todo o ensino médio em escola pública e, mesmo com todas as deficiências e dificuldades em sua formação, conseguiu a vaga tão desejada na universidade pública graças à cota racial.

“Estudei grande parte do período escolar em escola privada, como bolsista, por minha mãe ter sido professora, mas meu Ensino Médio foi completo no colégio estadual da minha cidade natal, Palmeira dos Índios, no Agreste alagoano. A Lei de Cotas permitiu à minha pessoa e a muitos outros amigos e amigas ingressarem no ensino superior mesmo havendo algumas dificuldades em nossa formação no ensino médio. Chegar à Ufal por meio da Lei de Cotas ampliou não apenas as possibilidades de aprendizado acadêmico, mas também o aprendizado pessoal, enquanto necessidade dessa ação afirmativa para tantos outros iguais”, afirma Jorgge.

Ele ressalta, principalmente, a diversificação dos discentes e também dos docentes em cursos antes considerados elitizados, como Medicina, Direito e, até mesmo, Arquitetura. “É mais do que perceptível que essa iniciativa veio a conduzir o ensino público para as classes que outrora sequer sonhavam ingressar numa universidade pública. O curso ao qual pertenço hoje é um exemplo, pois tal qual outros semelhantes em sua elitização começaram a mudar aos poucos os tons dentro das salas de aula, tanto nas cadeiras, com os alunos, quanto à frente das aulas, conduzindo-as, como formados que tiveram a oportunidade de voltar ao Campus agora como professores. Me agrada muito ver as mudanças nas placas de formatura, pois nos dá a real sensação de pertencimento do espaço, pois o ensino superior também é o nosso lugar”, afirmou.

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