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Imagem ilustrativa da imagem Seedorf e o Botafogo: bastidores explicam fim da relação de carinho

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Arivaldo Maia

Seedorf e o Botafogo: bastidores explicam fim da relação de carinho

Em dezembro de 2023, após participar de um amistoso entre lendas do São Paulo e do Milan, no Morumbi, Clarence Seedorf saiu andando ao ser perguntado sobre o Botafogo, clube em que se aposentou, há 10 anos. Questionado sobre a recente perda do Brasileirão e a situação do Alvinegro, o holandês ignorou e rumou ao vestiário.

A postura de evitar falar do ex-clube já havia chamado atenção dois dias antes, quando, no Rio, inaugurou um projeto social. Os dois casos provocaram a dúvida: como está a relação de Seedorf com o Botafogo?

- Ele tem conceitos muito rígidos. Como o Botafogo estava em descendente no campeonato e queriam explorar de forma pejorativa, ele não quis falar. Não acredito que ele não gostou de jogar do Botafogo - diz André Silva, vice-presidente de futebol à época da contratação do holandês.

A saída conturbada ajudou a arranhar uma relação que era de extremo carinho. O ge conta bastidores da passagem pelo Botafogo e da despedida do astro holandês, que envolvem atrasos salariais, promessas não cumpridas e uma série de tentativas de mudanças no dia a dia dos jogadores, como o veto a feijão no cardápio.

A chegada

Tudo começou em 2011. Liderado pelo então presidente Mauricio Assumpção - que morreu em 2023 -, o Botafogo procurava uma contratação de impacto. O clube chegou a cogitar Diego Ribas, então no Wolfsburg, e Ronaldinho Gaúcho, que já estava em conversas com o Flamengo.

Serginho, ex-lateral e que estava na diretoria do Milan, sugeriu Seedorf. O holandês, aos 35 anos, entrava na última temporada de contrato com o clube italiano, que não pretendia renová-lo. Além disso, o meia, com uma esposa brasileira, poderia ser convencido a atuar no Brasil.

- Eu e Mauricio fomos com o Serginho para Milão. Ao lado do Zé Renato, empresário que abriu as portas para a negociação. Conseguimos acertar tudo: salário, exploração de direitos de imagem… A primeira reunião durou seis horas, a segunda cinco horas. Passados dois dias, ele diz que o Berlusconi (então dono do Milan) o convidou para ficar mais um ano no Milan e, assim, queria deixar tudo acertado para o ano seguinte. Nós tínhamos medo de lesão, do preparo físico - conta André Silva.

À época, havia um comitê que acompanhava a diretoria de Maurício Assumpção. Inicialmente, este grupo, formado por dirigentes jurídicos e financeiros, não queria a contratação, por questões financeiras. Mas o presidente insistiu e, em um segundo momento, em junho de 2012, acertou com o holandês.

Além das questões esportivas, projetos de marketing seduziram o meia - seria uma forma de expandir a imagem do Botafogo no exterior. Ele receberia uma parte do valor de todas as campanhas publicitárias que fizesse pelo clube - além, claro, do salário fixo. Porém, durante o ano e meio que ele passou no time carioca, apenas uma propaganda foi gravada.

- Seedorf ficou desconfortável porque logo que ele chegou o vice-presidente (André) foi substituído. E o VP que veio não tinha conversa com ele. Ele ficou muito vinculado ao Anderson e exigia mentalidade vencedora do elenco. Eu passei a viajar muito com o time. Fiz uma intervenção com o grupo no jogo contra o Atlético-MG no Independência. Mas o Mauricio resolveu tirar o Anderson e tudo que foi negociado de propósitos - marketing, elevar o Botafogo, mentalidade - ruiu - revela Maíra Ruas Justo, psicóloga do clube entre 2009 e 2012.

A dupla André e Anderson Barros tinha a confiança de boa parte do elenco. Barros, atualmente no Palmeiras, era considerado importante pela boa relação com os atletas. Com os novos dirigentes, a situação era diferente. Foi neste contexto que Seedorf passou a dar opiniões em várias alas do futebol.

Mudanças e estresse

Seedorf criou rápidos vínculos de confiança com três pessoas: André Silva, o então diretor de futebol Anderson Barros e o técnico Oswaldo de Oliveira. Os três saíram do clube, o que incomodou o holandês.

André Silva foi exonerado após a estreia no Brasileirão de 2012, em maio - ainda antes de o camisa 10 iniciar a rotina de treinos no Rio de Janeiro. O meia estreou na derrota para o Grêmio, em 22 de julho, no Nilton Santos. Anderson Barros foi demitido seis meses depois, o que abriu espaço para a chegada de Chico Fonseca, novo vice de futebol.

Primeira temporada

De personalidade forte e com carreira concentrada na Europa, Seedorf começou o dia a dia no Botafogo com pensamentos diferentes daqueles a que os jogadores brasileiros estavam acostumados. Isso gerou um choque.

O camisa 10 não tinha medo de dar bronca e gritar com qualquer companheiro nos treinamentos, sempre disposto a corrigir algo que considerasse errado - desde movimentação tática a algum fundamento técnico. Em episódio envolvendo justamente um equívoco de um colega, conheceu outra pessoa com quem criou um importante vínculo: o ex-meia Fellype Gabriel.

- Estávamos em Saquarema, ele foi cobrar o Márcio Azevedo e não me senti bem. Teve essa discussão, eles se resolveram, mas eu o chamei quando estava indo para o quarto. Ainda não tinha intimidade, mas dei um berro, ele parou para ouvir. Disse que ele estava certo, que a gente deveria resolver os problemas do dia a dia na hora, mas para tomar cuidado com os repórteres porque tudo que ele falava tinha um peso grande. Com o Márcio (Azevedo), a partir daquilo, tudo que ele errasse a torcida iria em cima. Eu argumentei que a cultura do Brasil é diferente e, aos poucos, ele iria entender. E apostei que apareceria na televisão o que ele falou para o Márcio. Fui para o quarto, liguei a TV e deu a discussão no Globo Esporte. Depois acho que ele sentiu que eu estava querendo ajudá-lo. E aí ele passou a confiar em mim e nos aproximamos muito - conta Fellype.

Apesar das boas intenções, Seedorf irritou companheiros pela pressa ao sugerir mudanças em pouco tempo. Neste contexto, Fellype, fazia uma espécie de meio-campo entre o holandês e os outros jogadores com quem tinha amizade. Enquanto estavam no clube, Oswaldo de Oliveira e Anderson Barros conseguiam segurar as pontas e fazer com que as sugestões do camisa 10 fossem aceitas.

Algumas das sugestões feitas por Seedorf no Botafogo:

Não gostava do trecho "Não podes perder, perder para ninguém" no hino - achava que o certo deveria ser uma menção à vitória;

Voos fretados para viagens longas;

Queria que os roupeiros entregassem as camisas no cabide e não as dobrassem, porque acreditava que o uniforme amassado atrapalhava o atleta;

Não queria a presença de diretores no vestiário nos dias de jogos - acreditava que deveria ser um ambiente 100% dos jogadores;

Não queria que jogadores comessem feijão antes de jogos porque eles ficariam pesados;

Queria substituir linguiça de porco pela de boi na alimentação;

Aconselhava jogadores a não irem de chinelo para os treinos;

Pediu para o clube ter uma equipe multidisciplinar médica (com clínico-geral, fisioterapeuta e médico especializado em medicina esportiva).

Seedorf não abria mão de saber o que se passava no Botafogo, do campo até a nutrição. Preocupado com a imagem que o Alvinegro passava de dentro para fora, o holandês irritava algumas pessoas internamente pela postura.

Uma mudança importante, porém, impactou o grupo: Oswaldo de Oliveira, uma das pessoas de confiança do holandês, não teve o contrato renovado. O técnico no ano da Libertadores seria Eduardo Húngaro, mais uma pessoa indicada por Mauricio Assumpção. O ex-camisa 10 não gostou da decisão - ele perdera de vez, portanto, todos os elementos de firmeza que tinha internamente.

Incomodado com promessas quebradas, Seedorf viu a saída de Oswaldo como estopim. Ele decidiu aceitar o convite do Milan, feito diretamente por Silvio Berlusconi, para assumir como técnico. Saiu dizendo a pessoas próximas que teria continuado caso o treinador permanecesse.

Um dos poucos comentários de Seedorf sobre o ex-clube foi feito no fim de 2014, no Jogo das Estrelas organizado por Zico, no Maracanã. "Cada história tem um fim", respondeu o holandês, então desempregado após a breve passagem como treinador do Milan, ao ser questionado se assumiria o Botafogo.

Desde a saída do jogador, o Alvinegro e Seedorf não fizeram nenhuma campanha ou ação em conjunto.

- Não tenho a menor dúvida (de que a contratação deu certo). Muita gente diz que foi um custo alto para o retorno que teve. O retorno não é palpável. Estávamos com contrato pré-assinado com a Caixa, seria um dos maiores do Brasil de naming rights, aí veio a história de fechar o Engenhão. Ele trouxe muita coisa para o Botafogo. Ele era chato porque queria exigir, mas nós tentávamos entender e conversar. Ele ajudou muito - finaliza Chico Fonseca.

(Arivaldo Maia com Sergio Santana - ge - Rio de Janeiro)