
Informações publicadas pelo Jornal O Globo indicam que o governador Paulo Dantas (MDB) procurou diretamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para alertá-lo sobre os possíveis desdobramentos negativos da nomeação de Marluce Caldas ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A procuradora de Justiça alagoana é tia do prefeito de Maceió, JHC — aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e filiado ao PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.
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Segundo a reportagem do jornal, Paulo Dantas foi claro ao conversar com Lula por telefone, em abril: “Indicar Marluce é dar um presente para o bolsonarismo”, teria afirmado. Apesar do alerta, Lula ouviu sem indicar qual será sua decisão.
A vaga em disputa no STJ é destinada a um membro do Ministério Público e está em aberto há sete meses. Marluce Caldas integra a lista tríplice enviada a Lula em outubro do ano passado, ao lado de Carlos Frederico Santos, subprocurador, e Sammy Barbosa, procurador do Acre apoiado por Dantas e pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
A movimentação de JHC para emplacar a tia na Corte superior envolve uma articulação nos bastidores para trocar de partido. Embora ainda filiado ao PL, o prefeito já ensaiou migração para o PSD de Gilberto Kassab e, mais recentemente, para o PSB — legenda tradicionalmente aliada ao PT. Essa mudança teria apoio do prefeito de Recife, João Campos (PSB), mas sofre forte resistência dentro do próprio partido, especialmente de Paula Dantas, filha do governador e presidente estadual da sigla em Alagoas.
O histórico de JHC, contudo, gera forte desconfiança tanto em Alagoas quanto em Brasília. Fontes ouvidas por O Globo revelam que o prefeito estaria disposto a qualquer concessão para garantir a nomeação da tia, inclusive prometer apoio à reeleição de Lula em 2026 e romper com antigos aliados como Arthur Lira. No entanto, muitos veem essas promessas como frágeis e pouco confiáveis.
Na mesma conversa com o presidente, Paulo Dantas reforçou esse ponto: “JHC é mais acostumado a não cumprir compromissos do que a cumprir”, disse. Para o governador, é improvável que o prefeito, tido como o principal nome da direita em Alagoas, sustente um apoio firme à reeleição de Lula. “Como o maior líder da direita de Alagoas vai mudar de posição, dar um cavalo de pau nesse e amanhã vai estar votando no presidente Lula?”, questionou Dantas.
A dúvida quanto à fidelidade de JHC é compartilhada por dirigentes do PSB nacional. Eles lembram que o prefeito deixou o partido durante a campanha presidencial de 2022 para apoiar Bolsonaro, filiando-se ao PL. O anúncio da troca de partido, inclusive, foi feito no Palácio da Alvorada, ao lado de Bolsonaro, entre o primeiro e o segundo turno.
A eleição de 2022 ainda pesa nesse debate. Maceió, governada por JHC, foi a única capital do Nordeste onde Bolsonaro venceu Lula no segundo turno, com 57,18% dos votos contra 42,82%.
Conforme o O Globo apurou, a tentativa de JHC de se reaproximar da base de Lula e articular a nomeação da tia é vista com ceticismo por líderes políticos de diversos espectros. Uma fonte próxima aos bastidores resumiu: “JHC já se ofereceu a tudo em troca da tia. Ele prometeu até apoiar Renan Filho para o governo e concorrer ao Senado contra o próprio pai e Arthur Lira. A forma como se dispôs a trair Lira deixou todo mundo desconfiado. Na verdade, ninguém confia nele — nem Lula.”
Enquanto Lula já indicou o desembargador Carlos Pires Brandão, do TRF-1, para uma das vagas do STJ reservada à Justiça Federal, a cadeira destinada ao Ministério Público segue indefinida. A escolha final poderá ter reflexos não só no equilíbrio interno do tribunal, mas também nas alianças e palanques que estão sendo montados para as eleições de 2026.
Até o momento, JHC não se manifestou oficialmente sobre o assunto, e Marluce Caldas também não respondeu aos questionamentos enviados pela equipe do O Globo.