Samuel de Avelar, professor de Educação Física de 44 anos, e Rodrigo Barbosa, advogado de 43, têm idades e profissões distintas, mas algo em comum: a paixão por animais exóticos e silvestres, mantendo-os como bichos de estimação. Os dois são amigos, residem em Maceió e compartilham a experiência de ter esses pets. Na capital, uma clínica veterinária, inaugurada em 2022, é a única do estado especializada em atender esses animais, e é crescente a busca por seus serviços e a aquisição dessas espécies.
Avelar possui uma jiboia-arco-íris da Caatinga (Epicrates assisi), uma espécie silvestre encontrada em um bioma típico do Brasil, e Rodrigo tem três répteis: um lagarto e duas serpentes, considerados exóticos, já que não são da fauna brasileira.
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Samuel conta que adquiriu a jiboia, chamada Lampião, em um criadouro no Rio de Janeiro, em março de 2023, e que a vontade de ter a espécie em casa, como bicho de estimação, surgiu após acompanhar a sobrinha em uma exposição de animais silvestres em um shopping. No local, ele percebeu que entendia mais do que imaginava sobre os animais.
“Durante a troca de turno dos estagiários que apresentavam os animais, eles erraram as posições e não se atentaram ao fato de que o discurso estava errado”, lembra.
A partir disso, começou a estudar sobre o assunto e foi informado por um amigo que poderia criar algumas espécies em casa, de forma legal. “O que mais me motivou a ir atrás foi a possibilidade de ajudar na preservação da espécie”, destaca.
Lampião vive em um terrário na casa de Samuel e sua esposa. Segundo o professor, os cuidados são mínimos, comparados com um animal de estimação, como gato e cachorro. “Quando ele [Lampião] completou um ano comigo, eu o levei ao veterinário. É um tipo de animal que o veterinário não gosta. Não gosta porque não gera muito atendimento, pois raramente adoece, não tem vacina e não transmite doenças. Meu único gasto é com alimentação e ornamentação em seu terrário”, diz.
A base de alimentação de Lampião são roedores. “Eu tenho ratos na geladeira. Por mais assustador que pareça, não é. Vêm tudo embalado e Lampião come de 10 em 10 dias.”
Já Rodrigo, desde 2021, cria três répteis. “Sempre gostei de animais, como cães e peixes. Em 2021, após conversas com um amigo biólogo que cria répteis, passei a estudá-los. Adquiri meu primeiro, um gecko-leopardo, em 2022. E em 2023, adquiri duas serpentes”, diz ele.
O lagarto é de origem paquistanesa e é da espécie leopard gecko (lagartixa leopardo), e tem esse nome pelas manchas no corpo. É uma fêmea com 1 ano e 9 meses. Quanto às serpentes, uma delas é uma sand boa (jiboia da areia), de origem africana, fêmea, com 1 ano e 5 meses. Ela tem esse nome porque tem o hábito de se enterrar na areia. A outra serpente, um macho da espécie ball python (piton bola), tem 1 ano e 3 meses e tem esse nome porque se enrola formando uma bola como mecanismo de defesa.
“Todos eles são legalizados. Foram adquiridos em criadouros com autorização de manejo, reprodução e venda. Os meus são considerados exóticos, já que não são da fauna brasileira”, fala.
Assim como a jiboia de Samuel, os animais de Rodrigo não têm muita manutenção e custo. “São [custos] bem mais simples que qualquer outro animal que já tive. Nos terrários, mantenho controle de temperatura e umidade com equipamentos apropriados. A alimentação das serpentes ocorre uma vez a cada 10 dias, com camundongos previamente abatidos, adquiridos em biotérios. E o lagarto é alimentado a cada 3 dias, com duas espécies de baratas que eu mesmo crio”, explica.
De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), apenas criadouros registrados podem comercializar algumas espécies de animais silvestres, com emissão de nota fiscal e atestado de procedência emitido pelo Ibama. Além disso, dependendo do animal, será necessário o uso de anilha ou microchip, o que possibilita a identificação da espécie.
A Vetz é uma clínica veterinária totalmente especializada em animais silvestres e exóticos, inaugurada em 2022, na Gruta de Lourdes. “Ela conta com serviços de atendimento especializado na clínica e à domicílio, realização de exames, cirurgias, internamento, consultorias e assistências para criatórios”, explica Amanda de Carvalho Moreira, médica veterinária que atua na área de clínica de animais silvestres e exóticos.
A clínica conta com dois médicos veterinários especializados em clínica e cirurgia de animais silvestres e exóticos, uma equipe de estagiários e uma recepcionista. A maior procura na clínica consiste nas espécies mais comumente criadas como pets, como calopsitas, periquitos, papagaios, coelhos, porquinhos-da-índia e jabutis.
“Por serem pets não convencionais, temos uma grande procura por consultas de check-up e orientação, tendo em vista que boa parte dos problemas de saúde desses animais está relacionada a erros de manejo”, fala Amanda.
O mercado de pets não convencionais vem crescendo, e atualmente a Vetz tem, em média, 40 a 50 atendimentos por mês. Além de bichos criados como animais de estimação, a clínica também realiza atendimento a animais silvestres resgatados e presta assistência a criatórios comerciais, porém trabalha de forma autônoma, sem parceria com órgãos ambientais.
“A rotina clínica de animais silvestres e exóticos é bem diversificada e acabamos tendo contato com espécies variadas e inusitadas. Os atendimentos de peixes e invertebrados são os que mais costumam chamar a atenção. Já tivemos algumas espécies de peixes em tratamento e internamento conosco, e recentemente tivemos a visita de uma aranha caranguejeira que veio para atendimento clínico e tratamento de uma lesão. Todos criados como bichos de estimação”
A médica veterinária também explicou a diferença entre animais exóticos e silvestres: “Espécies silvestres são nativas, ou seja, aquelas que pertencem à nossa fauna, podendo ser encontradas em vida livre em nosso território. Já as exóticas são as espécies originadas em outros países, não ocorrendo naturalmente no nosso território.”
Atualmente, diversas espécies de animais silvestres e exóticos podem ser criadas como pets, desde que sejam adquiridas de criatórios legalizados, e há uma lista no site do Ibama, que pode ser acessada por quem se interessar, incluindo algumas espécies de cobras, pássaros e ouriços.
No entanto, a competência para autorizar a criação de fauna silvestre passou a ser Órgão Estadual do Meio Ambiente (IMA) e não mais do Ibama (órgão ambiental federal). “Isto ocorre porque, em 2011, foi publicada a Lei Complementar nº 140/2011, a qual definiu as competências da União, dos Estados e dos Municípios. No inciso XIX do Art. 8º desta Lei está definido que a competência para autorizar criadouro (e demais categorias de empreendimentos de fauna silvestre) é do Estado”, informa nota do Ibama enviada à Gazeta.
Assim, a gestão do Centro de Triagem de Animais Silvestres em Alagoas (CETAS) passou a ser compartilhada entre o IMA/AL e o Ibama. O CETAS cuida da fauna silvestre, recebendo, identificando, marcando, avaliando, tratando e reabilitando animais resgatados ou entregues voluntariamente. Filhotes órfãos, animais feridos ou com histórico prolongado em cativeiro recebem tratamento e reabilitação para fortalecer suas habilidades selvagens antes da soltura em seus habitats naturais ou são encaminhados para criadouros.