Quando o Brasil finalmente teve a emancipação de Portugal declarada, no longínquo 7 de setembro de 1822, Alagoas respirava o ar fresco da própria liberdade de Pernambuco, efetivada em 1817. Agora, no bicentenário da Independência do Brasil, intelectuais alagoanos se perguntam o papel que uma província emergente teria ocupado no período. “Alagoas teve uma participação efetiva nesse tema tão interessante? Ou apenas resíduos da historiografia de uma região até então periférica?”, provoca o pensador Douglas Apratto.
Para responder a essas questões, ele recorre ao contexto histórico do Brasil, de Alagoas e do Nordeste. Pouco tempo antes das animosidades emancipatórias, a região vivia um período próspero, resultado do excelente desempenho agrícola e industrial nordestino. A Família Real, por sua vez, enquadrou os líderes regionais, em busca de dinheiro para custear salários, roupas e festas na corte.
No entanto, apesar do relativo êxito econômico do Nordeste, a indústria regional não suportou a cobrança cada vez mais excessiva de impostos por parte da coroa portuguesa. O que desencadeou revoltas e motivou a chamada Revolução Pernambucana, derrotada militarmente pelas forças imperiais.
Há quem diga, relata o professor e historiador, que a independência de Alagoas de Pernambuco tenha sido um prêmio aos fazendeiros da região pela sua fidelidade à coroa durante o levante pernambucano. Mas o estado ainda teria outros episódios nessa trama que culminaria na Independência do Brasil.

“Imaginemos Alagoas em 1822. Uma capitania recém emancipada, mergulhada no clima de tensão, de instabilidade política pela qual passava o Brasil. Organizava com dificuldade, portanto, o seu aparelhamento institucional. Com coisas simples, como a introdução da imprensa na província, uma mera tipografia, que foi negada pela corte. Numa época de difíceis comunicações, a notícia do grito do Ipiranga só chegou aqui algumas semanas depois”, narra Douglas Apratto.
Antes disso, porém, D. Pedro I veio a Alagoas, em 28 de junho de 1822, para receber o título de Defensor Perpétuo do Brasil, uma homenagem da Maçonaria adotada pelo Senado da Câmara do Rio de Janeiro. A escolha do local é mais um indício da importância da minúscula província, Vila das Alagoas, na história da independência.
A reunião para conceder a honraria a D. Pedro ocorreu na Igreja Matriz, com participação do governo, clero, oficiais de guerra e representantes populares.
PROVÍNCIA INSURGENTE
De acordo com Edberto Ticianeli, jornalista e pesquisador do site História de Alagoas, a reunião, que tinha o objetivo de demonstrar o respeito dos alagoanos ao príncipe regente, se transformou em um levante revolucionário que exigiu o afastamento de todos os portugueses do governo alagoano, com exceção de três, entre eles o comandante da tropa de linha da capital, João Eduardo Pereira Colaço.

“O movimento pela Independência transformou a reunião numa rebelião. Assim, populares cercaram a Igreja Matriz, ao lado do corpo de Tropa de Linha, que estava sublevado, e mais 400 voluntários amotinados sob o comando de Jerônimo Cavalcante de Albuquerque”, diz trecho de artigo de Ticianeli.
“Alagoas ainda teve participação nos momentos que antecederam a Independência quando elegeu cinco deputados à Assembleia Constituinte Brasileira. Craveiro Costa, no livro História das Alagoas, vai além. Para ele, os acontecimentos de 28 de junho colocam Alagoas como a primeira província insurgente, ou seja, que se levantou contra a coroa e exigiu um governo formado por brasileiros, tirando, à força, dezenas de portugueses de suas funções.
Douglas Apratto corrobora com a versão de Craveiro Costa. No entanto, quis colocar alguns pingos nos Is. “Nem todos concordaram com essa atitude. Um dos nossos cronistas chama a nova Junta de “pandêmonica”, que não só perseguiu e retirou os estrangeiros, mas incorreu em inúmeras arbitrariedades e violências. Distribuiu com os seus, militares e civis, os melhores empregos. Deu origem por aqui à famosa dança dos cargos. Ela também despachou, para a corte do Rio de Janeiro, uma quantia para hipotecar apoio ao príncipe Dom Pedro. Porém, os acontecimentos ocorridos aqui não foram vistos com simpatia pelo Sul, acharam a dose excessiva e questionaram se não havia resquícios do republicanismo da Revolução Pernambucana de cinco anos atrás”, pontua o professor.
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Apratto completa dizendo que alagoanos deram sua contribuição em confrontos decisivos da chamada Guerra da Independência. E estavam presentes quando a hora solene da separação tinha chegado. “Os efeitos disso continuaram durante toda a metade do século XIX, até a Constituinte e maioridade de D. Pedro II, quando desanuviou mais o clima”, finaliza Apratto.
A antropóloga Luitgarde Barros diz que “não tem como discutir nenhum assunto brasileiro sem citar um alagoano”. E, concordam os historiadores, desde antes da Independência, que festeja seu bicentenário, o Brasil conta com os alagoanos. De Alagoas saíram o primeiro e o segundo presidentes da República, o primeiro presidente após a redemocratização, além dos parlamentares de destaque que ocupam historicamente o Congresso Nacional e o Senado Federal.