Em cada música, uma investigação diferente. Para Chico Torres, compositor, instrumentista, cineclubista e produtor alagoano, “Segunda Navegação” — álbum de estreia do experiente artista nascido em Maceió e que acaba de ser lançado — é um amontoado de sentimentos e ideias que constituem convites especiais: embarcar em 10 poemas selecionados de escritores de Alagoas e navegar pelos timbres e sotaques das 10 cantoras que os interpretam no disco. O destino final, cabe a cada ouvinte descobrir.
Produzido por Chico, em parceria com Dinho Zampier, as dez faixas inéditas, todas elas fundamentadas no violão, têm os arranjos e criações melódicas assinadas por ele. As intérpretes são de todo o Brasil. A obra está disponível em todas as plataformas de streaming de música.
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O nome do trabalho tem uma explicação que acaba por sintetizar a ideia que o álbum traz consigo: “Na Filosofia, o termo ‘segunda navegação’ explica aquela vida que há além da vida cotidiana. A primeira navegação você bota o barco para se movimentar, é o dia a dia que a gente faz acontecer. Já a ‘segunda navegação’ traz esse lado da vida enquanto possibilidade da reflexão, do pensamento, do que é mais subjetivo”, diz Chico, que também é filósofo formado. “De alguma forma penso que o disco é uma ‘segunda navegação’ desses poemas. Que nasceram no papel, como poemas, para serem lidos. E agora ganham um novo campo de expansão, que são as melodias, as canções em si”, completa.
São 10 canções que se diferem umas das outras, dificultando propositalmente a construção de uma narrativa única: a intenção aqui é justamente o contrário. “Me inspiro em discos como ‘O Grande Circo Místico’ (1981) de Edu Lobo e Chico Buarque, e ‘Ode Descontínua e Remota para Flauta e Oboé - De Ariana para Dionísio’ (2005), no qual Zeca Baleiro musica poemas de Hilda Hilst. Outra grande referência é o experimentalismo de Caetano nos discos dos anos 1970, que nada conversa com nada, cada música é uma investigação diferente. Quis fazer algo assim, um disco que reúne poemas diferentes e, consequentemente, gerou músicas diferentes”, afirma Chico.
Para costurar “Segunda Navegação”, Chico Torres — que tem nome de rio — pesca poemas desde 2020. Natural daquele período apocalíptico, de pandemia, algumas colaborações foram feitas à distância, e outras, como é o caso de “Pois é”, brilhantemente interpretada por Cris Braun, refletem sobre aquele momento.
“Vi um primeiro poema e tive o ímpeto de musicá-lo. Fiz isso com uns dois poemas e comecei a propor aquelas gravações em ‘modo pandemia’: tela dividida, trocas de ideias e tudo mais… Fui compondo, mas sem pretensão de ser um disco”, ele relembra.
“Ao longo do processo fui entendendo que seria um álbum interpretado apenas por mulheres, são 10 intérpretes distintas, para 10 poemas distintos. As autorias desses poemas também não se repetem”, entrega o músico.
“Segunda Navegação” foi gravado com banda, apenas uma faixa se mantém somente com violão, piano e cordas. Foi um processo de gravação muito colaborativo, com a presença de músicos alagoanos, que são parceiros de Chico em outros projetos. “Abri mão de algumas coisas também, claro, até pelo tempo que a gente tinha para fazer esse trabalho. Mudou muito das primeiras ideias, mas achei interessante isso, foi um processo importante para mim também no sentido de deixar rolar. O violão é a alma de tudo, disso eu não abri mão, mas várias construções ali também partiram diretamente dos músicos que integram a ficha técnica. E no final ficou tudo muito interessante”, ele cita.
O álbum traz os poemas de Rafaela Gomes, Lucas Litrento, Nathália Agra, Amanda Prado, Felipe Benício, Tazio Zambi, Milton Rosendo, Karen Pimentel, Ana Maria Vasconcelos e Lee Flores; interpretados por Renata Chiquetto, Bárbara Castelões, May Honorato, Cláudia Castelo Branco, Andréa Laís, Cris Braun, Iara Ferreira, Renata Peixoto, Martha Brandão e Jéssica Nucci.
Karen Pimentel se disse surpresa com a ideia de Chico para musicar um poema dela, “Colheita”, que no disco é interpretado por Renata Peixoto. “Pensei: eu escrevo para ler em voz alta, mas será que dá pra cantar? Esse outro modo de falar em voz alta, outro modo de ler um texto. E acabou que deu certo, e agora todos podem ler em voz alta, cantando, o meu ‘Colheita’”, reflete a poeta.
Ouça o álbum no Spotify
“Eu fiquei muito contente em fazer parte do disco do Chico Torres, especialmente pelo convite para gravar uma parceria dele com o maravilhoso poeta Milton Rosendo, de quem eu sou absolutamente fã e cujo livro eu vinha lendo no momento em que o Chico me convidou. Então, foi uma confluência astral maravilhosa! Eu gravei ‘Sísifo’, um poema formidável do Milton que o Chico musicou com muita propriedade e com muita beleza”, expõe Iara Ferreira, intérprete da nona faixa de “Segunda Navegação”.
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