Enquanto a pesquisa de emprego formal do Ministério da Economia, o
Caged, mostrou uma redução no ritmo de demissões de trabalhadores com
Leia também
carteira assinada em junho, a Pnad Contínua, do IBGE, indica que os
efeitos da pandemia de Covid-19 para o mercado de trabalho seguem
devastadores.
No segundo trimestre deste ano, o primeiro
inteiramente sob os efeitos da crise sanitária, 8,9 milhões de pessoas
ficaram sem qualquer tipo de ocupação.
Para o economista Daniel
Duque, pesquisador da área de Economia Aplicada do Ibre (Instituto
Brasileiro de Economia) da Fundação Getulio Vargas, os dados divulgados
na quinta (6) pelo IBGE mostram uma continuidade na deterioração do
mercado de trabalho.
"O que me surpreendeu foi que não houve
qualquer sinal de recuperação ou de desaceleração da piora do mercado de
trabalho pela Pnad Contínua", diz.
A taxa de desemprego no
trimestre, diz o pesquisador, só não foi pior porque as pessoas estão
saindo da força de trabalho. Ou seja, quem foi demitido ou ficou sem
poder trabalhar, como é o caso de muitos informais, ainda não está
buscando emprego.
Para o IBGE, só está desempregado quem procurou vaga e não encontrou nos 30 dias anteriores à pesquisa.
O
auxílio emergencial de R$ 600 também tem um efeito positivo sobre a
taxa de desocupação. Por isso, Duque diz que deverá haver uma aceleração
da taxa de desemprego se não houver a prorrogação do benefício pago
pelo governo.Pergunta - A Pnad Contínua divulgada nesta quinta (6) traz
os dados do período mais crítico da pandemia, de abril a junho. O que o
sr. considerou mais importante?
DD - Mostra que junho continua
tendo uma piora no mercado de trabalho. Algumas pessoas esperavam alguma
recuperação, pois os dados do Caged apontavam uma melhora razoável da
situação em relação ao fundo do poço, que foram os meses de abril e maio
-principalmente abril.
Mas a Pnad Contínua, pelo contrário,
mostrou uma continuidade da degradação da situação do mercado de
trabalho, com uma queda ainda maior no número de ocupações, um aumento
ainda maior do desalento e da subutilização do trabalho.
Então,
o que me surpreendeu mesmo foi que não houve qualquer sinal de
recuperação ou de desaceleração da piora do mercado de trabalho pela
Pnad Contínua.Quando o Caged saiu, integrantes da equipe econômica
disseram que as demissões tinha desacelerado e que o desemprego seguia
alto porque não havia contratação.
DD - Houve grande descompasso
entre a Pnad Contínua e o Caged. A queda de empregos com carteira
assinada na Pnad, entre maio e junho, foi de 1 milhão de empregos. No
Caged, a redução foi de 11 mil. Isso não faz muito sentido. Mesmo com
uma ou outra defasagem, não é o normal ter um discrepância tão grande.
Isso levanta algumas hipóteses, como o atraso no registro dos
desligamentos.O número de pessoas que deixaram a força de trabalho é
muito similar ao que saiu da população ocupada. É por isso que o número
de desocupados ficou estável?
DD - Exatamente por isso. As pessoas
que estão perdendo suas ocupações não estão procurando novos empregos.
Fiz um exercício mostrando que se a força trabalho -que inclui ocupados e
desocupados- fosse a mesma do trimestre terminado em fevereiro deste
ano, a gente teria uma taxa de desemprego hoje de 21,4%.
A saída
da força de trabalho está segurando, e muito, a taxa de desocupação. Ela
está em taxas elevadas e, no entanto, estaria muito pior, assim, muito,
muito pior mesmo, se não fossem as pessoas saindo da força de
trabalho.Quantos seriam esses 21% desempregados?
DD
- Hoje a força de trabalho tem 96 milhões de pessoas. Em fevereiro,
eram 106 milhões, 10 milhões a mais. Temos hoje 12,8 milhões de
desocupados, o equivalente a 13,3% da força de trabalho. Se a gente
tivesse a mesma força de trabalho de fevereiro de 2020 e a mesma
população ocupada de hoje, teríamos 20,6 milhões de desocupados.Com o
avanço dos meses, com mais atividades sendo liberadas e o distanciamento
social mais diluído, o sr. acha que essas pessoas que saíram da força
de trabalho ou que estão no desalento voltarão à busca por emprego? Há o
risco de chegarmos a uma taxa de 21% de desemprego?
DD - Talvez
não chegue a 21% porque vai ter uma recuperação da população ocupada,
mas certamente a taxa de desemprego vai aumentar conforme o auxílio
emergencial for acabando.
Temos uma situação em que, muito
provavelmente, a taxa de desocupação vai passar dos 15%, mas acho
difícil chegar a 21%. Pessoas que voltarem à força de trabalho devem
conseguir se ocupar conforme haja alguma recuperação cíclica após
pandemia.Essa redução na força de trabalho, que conteve a pressão sobre a
taxa de desemprego, indica o que da situação da economia e do mercado
de trabalho?
DD - São três motivos. Uma questão é o próprio medo
de pegar Covid-19. A pessoa evita sair de casa -e precisa sair de casa
para procurar trabalho. Depois, as pessoas sabem quem não têm emprego
nos arreadores, têm consciência disso. E terceiro, as pessoas, ao mesmo
tempo que sabem que está difícil procurar emprego, muitas estão
recebendo o auxílio emergencial. Então há alguma renda, e R$ 600 é muita
coisa para muita gente.O que a gente deve esperar para os próximos
meses?
DD - A Pnad Covid, que sai semanalmente, não tem dado
nenhum indicativo ainda de recuperação robusta do mercado de trabalho. A
própria força de trabalho e a taxa de participação, que estavam
aumentando, voltaram a não ter direção clara.
Ou seja, as pessoas
estão percebendo que, apesar do relaxamento das restrições, ainda há
nenhuma grande recuperação da economia e do emprego. Pelo menos para
julho e agosto, não tenho grandes esperanças de que a gente vá ter
alguma reação do mercado de trabalho.
Talvez no mês seguinte, mas
isso vai coincidir com a redução ou o com fim do auxílio emergencial, o
que vai fazer com que muita gente volte a procurar emprego e isso vai
pressionar bastante a taxa de desemprego.O sr. que pode se confirmar a
previsão do secretário [de Política Econômica do Ministério da Economia]
Adolfo Sachsida, de que haverá um repique do desemprego em setembro?
DD - Sem dúvida vai ter.