O laboratório responsável pelos exames nos doadores de órgãos infectados com HIV foi interditado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) nesta quinta-feira (10), segundo a Prefeitura de Nova Iguaçu.
Seis pessoas que estavam na fila do transplante da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ) receberam órgãos contaminados pelo HIV e agora testaram positivo para o vírus. O incidente é inédito na história do serviço.
Leia também
O PCS Lab Saleme fica nas proximidades do Calçadão de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. O endereço da clínica, que há mais de 50 anos faz exames, é Travessa Quaresma, onde existem diversas unidades de saúde.
O g1 esteve no local nesta sexta-feira (11) e tentou falar com a direção ou funcionários. No entanto, o espaço estava fechado e trancado.
Um papel fixado na porta da frente dizia: "Estamos em Manutenção! Para acesso aos resultados de exames, somente através do nosso site: pcslab.com.br". A reportagem tenta contato telefônico com o laboratório.
A Secretaria Municipal de Saúde de Nova Iguaçu (Semus) informou que o contrato com o PCS Laboratório Saleme foi encerrado em fevereiro deste ano, passando a ser administrado pelas OS responsáveis pela rede de atenção básica do município.
Já o contrato entre o PCS e a OS foi encerrado nesta quinta (11), assim que a Semus recebeu a notificação sobre a interdição cautelar feita pela Anvisa.
'Situação sem precedentes'
A notícia sobre a contaminação foi dada pela BandNews FM nesta sexta (11). À TV Globo e ao g1, a SES-RJ confirmou as informações. O incidente também é investigado pelo Ministério da Saúde e pela Polícia Civil do RJ.
“Esta é uma situação sem precedentes. O serviço de transplantes no Estado do Rio de Janeiro sempre realizou um trabalho de excelência e, desde 2006, salvou as vidas de mais de 16 mil pessoas”, declarou a SES-RJ.
O governo do estado disse que o erro é do PCS Lab Saleme, que foi contratado em uma licitação no fim do ano passado para fazer a sorologia de órgãos doados.
A Coordenadoria Estadual de Transplantes e a Vigilância Sanitária Estadual interditaram o laboratório, e o caso é investigado pela Delegacia do Consumidor (Decon) da Polícia Civil.
A Anvisa descobriu ainda que o PCS não tinha kits para realização dos exames de sangue nem apresentou documentos comprovando a compra dos itens, o que levantou a suspeita de que os testes podem não ter sido feitos e que os resultados tenham sido forjados.
Esse estabelecimento foi contratado pela SES-RJ em dezembro do ano passado, em um processo de licitação emergencial no valor de R$ 11 milhões.
Transplante em janeiro
A situação foi descoberta no último dia 10 de setembro, quando um paciente transplantado foi ao hospital com sintomas neurológicos e teve o resultado para HIV positivo; ele não tinha o vírus antes.
Esse paciente recebeu um coração no fim de janeiro. A partir daí, as autoridades refizeram todo o processo e chegaram a 2 exames feitos pelo PCS Lab Saleme.
A primeira coleta foi feita no dia 23 de janeiro deste ano — foram doados os rins, o fígado, o coração e a córnea, e todos, segundo o laboratório, deram não reagentes para HIV.
Sempre que um órgão é doado, uma amostra é guardada. A SES-RJ, então, fez uma contraprova do material e identificou o HIV. Em paralelo, a pasta rastreou os demais receptores e confirmou que as pessoas que receberam 1 rim cada também deram positivo para o HIV. A que recebeu a córnea, que não é tão vascularizada, deu negativo. A que recebeu o fígado morreu pouco depois do transplante, mas o quadro dela já era grave, e a morte não teria relação com o HIV.
No dia 3 de outubro, mais um transplantado também apresentou sintomas neurológicos e testou positivo para HIV. Essa pessoa também não tinha o vírus antes da cirurgia. Cruzando os dados, chegaram a outro exame errado, o de uma doadora no dia 25 de maio deste ano.
Reteste
A secretária estadual de Saúde, Cláudia Mello, disse que a 1ª ação tomada foi de transferir todos os exames de sorologia dos doadores desse laboratório para o Hemorio, uma unidade de saúde estadual.
“Então, a partir do dia 13 de setembro, toda a doação é passada direto das doações para o Hemorio”, disse Cláudia. O departamento vai retestar o material armazenado de 286 doadores.
O que a SES-RJ diz
“A Secretaria de Estado de Saúde (SES) considera o caso inadmissível. Uma comissão multidisciplinar foi criada para acolher os pacientes afetados e, imediatamente, foram tomadas medidas para garantir a segurança dos transplantados.
O laboratório privado, contratado por licitação pela Fundação Saúde para atender o programa de transplantes, teve o serviço suspenso logo após a ciência do caso e foi interditado cautelarmente. Com isso, os exames passaram a ser realizados pelo Hemorio.
A Secretaria está realizando um rastreio com a reavaliação de todas as amostras de sangue armazenadas dos doadores, a partir de dezembro de 2023, data da contratação do laboratório.
Uma sindicância foi instaurada para identificar e punir os responsáveis. Por necessidade de preservação das identidades dos doadores e transplantados, bem como do encaminhamento da sindicância, não serão divulgados detalhes das circunstâncias.
Esta é uma situação sem precedentes. O serviço de transplantes no Estado do Rio de Janeiro sempre realizou um trabalho de excelência e, desde 2006, salvou as vidas de mais de 16 mil pessoas.”