É Natal! Mais um ano sendo finalizado. Hoje o dia e a noite vivem a confraternização entre as famílias. A tradição preconiza o preparo da ceia natalina, mas quem divide o serviço e o cuidado? Todos que se sentam à mesa? Se a ceia foi basicamente preparada por mulheres, por que elas mal podem sentar-se ou ficarem à vontade para serem servidas?
"Ainda não…" essa é a negação mais ouvida nos últimos tempos quando tratamos da equidade de gênero. O preparo da ceia natalina nos releva os desníveis sociais entre o trabalho, remuneração e funções entre homens e mulheres.
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Mas você sabe o que é equidade de gênero? Equidade de gênero é um direito humano básico e um pilar para a construção de uma sociedade livre.
Em uma sociedade em que homens e mulheres podem preparar juntos a ceia de Natal, todos devem sentar juntos para celebrar e comer. É nessa divisão justa das tarefas domésticas que a sociedade ganha também, pois percebe as desigualdades e busca mudar a realidade por meio da equidade de gênero.
Na sociedade brasileira mulheres e meninas contribuem diretamente para o crescimento econômico, tanto quanto os homens. Então, sentar-se à mesa com uma divisão justa do trabalho doméstico e com equidade salarial, não deveria ser natural?
Enquanto isso, 2024 continuou sendo mais um ano difícil para as mulheres, apesar da população brasileira, segundo o IBGE, ser composta por 51,2% de mulheres e 48,8% de homens. Ainda é forte a descrença na igualdade dos direitos. No Brasil, cerca de 51% da população acredita que mulheres brancas e negras não têm as mesmas oportunidades e direitos. As mulheres pretas e pardas são as mais afetadas pela pobreza e pelas desigualdades na educação (IBGE, 2024), e a desigualdade salarial, ainda que se tenha a Lei pela Igualdade Salarial, continua sendo perpetuada. É nesse diapasão que as mulheres ganham cerca de 21% menos do que os homens. Em agosto de 2024, o salário médio de admissão das mulheres era de R$ 2.031, enquanto o dos homens era de R$ 2.245 (FGV).
Cresceu a participação das mulheres no mercado de trabalho formal, principalmente, nas chamadas ocupações de "vendedores e prestadores de serviços de comércio" e "trabalhadores de atendimento ao público", porém ainda é baixa a participação feminina em cargos de liderança. Mulheres ocupam menos de 20% das posições de alta liderança em empresas e cargos públicos como Magistratura, Carreira de Delegada, grandes postos na Justiça Federal, entre outros.
Apesar do largo esforço que existem com algumas políticas públicas que apoiam as mulheres, a exemplo das Casas da Mulher Brasileira, Centros de Referência, Ligue 180 e o Pacto Nacional contra o Feminicídio - este sendo remontado peça por peça no último ano -, a violência ainda é muito presente. O nosso principal desafio hoje é construir um plano para a diminuição da violência real.
Nós, mulheres, não nos importamos em organizar a ceia e servi-la aqueles quem amamos, mas nos importamos e muito em passar ano a ano lutando contra a desigualdade e pelo nosso bem viver que já deveria ser um Direito básico garantido desde 1979.
Pois bem, parece que esse presente ainda ficou para o natal que vem...
Estamos cansadas de ouvir histórias de vida e morte de mulheres que tentaram romper ciclos violentos e por isso morreram, ou de mulheres tão controladas pelo companheiro que param de estudar, vivem trancadas em casa, são impedidas de ver a família e num natal como este estarão servidos a mesa toda a dor e frustração de não poder ainda sair desse ciclo, porque está doente demais, cansada ou é pobre demais para ir embora com seus filhos.
Que neste Natal a paz, a fraternidade e a Equidade sentem à mesa e estejam presentes na consciência e em cada lar brasileiro e alagoano para somente assim transformarmos a nossa realidade. E que o espírito de renascimento possa nos fazer renascer como humanidade.
*Os artigos assinados são de responsabilidade dos seus autores, não representando, necessariamente, a opinião da Organização Arnon de Mello.