Dietas engordam. Quem diz é a coach em nutrição e doutora da Universidade de São Paulo, Sophie Deram, uma ativista do emagrecer com saúde. "Enlouquecemos, não sabemos mais o que comer. Proibiram o açúcar, a gordura, o carboidrato, glúten, lactose. Não sobra mais nada, é loucura", reflete.
A francobrasileira é referência quando o assunto é estar em paz com os alimentos e reencontrar o prazer alimentar. Comer sem culpa e de maneira saudável, como nos tempos das nossas avós, para ela, é possível. Ainda na universidade, seu livro "O peso das dietas" é referência na pesquisa do tratamento.
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Glamour: Por que não conseguimos nos manter na dieta?
Sophie Deram: É normal fracassar. Quem fala que consegue viver na dieta ou está mentindo ou está com transtorno alimentar. [Esse pensamento] é uma mudança de paradigma na alimentação muito grande e vai tudo contra o que foi falado por muito tempo. Estamos falando de dietas restritivas, aquelas que limitam alimentos com o intuito de emagrecer. Não vale o mesmo para uma pessoa que tem alguma doença e é obrigada a cortar um tipo de alimento.
G: E por que voltamos a engordar?
SD:Quando se estuda o cérebro, vemos que ele odeia fazer dieta. Então, a gente força algum alimento ou grupo alimentar, diminui a contagem de calorias. Isso é percebido pelo nosso sistema de sobrevivência como uma ameaça. Você não escuta mais o seu próprio instinto, que é o de comer, e o assusta. E [seu organismo] reage com uma fome aumentada. Quando não respeitamos o básico, que é a fome, descontamos em alimentos mais gordurosos, mais doces, em vários momentos e não um só, e de forma descontrolada. Você nunca vai descontar seu sentimento em um brócolis. Será sorvete, chocolate, bolacha ou algo gorduroso.
G: O fracasso da dieta é esperado?
SD:Sim, pois o aumenta e nosso metabolismo entra em modo de economia [de energia], ou seja, ele diminui. Por isso que todo mundo fracassa. Se você pensar bem, em pouco tempo você está comendo mais devido ao apetite aumentado. E vai gastar menos devido ao metabolismo lento. Ou seja, vai engordar. O que vejo hoje é que todo mundo está de dieta, ficamos quase sem comer e, de repente, comemos demais. Esse é um desrespeito da nossa necessidade básica.
G: Por que os nutricionistas insistem em indicar dietas restritivas?
SD:Muitos nutricionistas acham que esse é o caminho, o da dieta. É um paradigma. Não sou eu apenas quem está dizendo que fazer dieta não funciona. É a ciência. Já estamos fazendo dieta há mais de 40 anos e o mundo tem engordado cada vez mais. Um estudo da Global Burden of Disease avaliou que nenhum país conseguiu diminuir a obesidade nesses últimos 30 anos. É um fracasso total. E quando isso acontece, temos de rever o tratamento, certo?
G: E qual é a solução correta para emagrecer de vez?
SD:O caminho mais indicado é o de respeitar a sua própria fome e entender sua saciedade. Quando se está com fome, deve-se comer até ficar satisfeito. Mas, claro, há uma dificuldade atual que é de não saber mais o que é fome. Quem faz dieta, por exemplo, não sabe mais identificar. E aí confunde tudo e come por razões que não são fome, como tristeza, tédio, cansaço, felicidade e por aí vai.
G: Essa teoria é comprovada?
SD:Claro, há estudos no mundo inteiro, pesquisas de até 100 anos atrás. E o resultado é o mesmo em todos os países: 95% das pessoas que fazem dieta restritiva voltam a engordar. É o efeito sanfona. Há estudos com meninas de 5 anos em que foram separadas em dois grupos, um com quem sofre restrição pelos pais e as que estão em paz com a comida. O resultado: o primeiro grupo ficou mais gordo.
G: Como saber se é fome ou tristeza?
SD:A pessoa transforma toda e qualquer questão de sua vida em comer. E acaba comendo muito além da própria fome. Trabalhamos isso no consultório, a parte mais consciente do comer, que é reeducar o paciente a prestar atenção a sua fome. Precisamos reorganizar tudo isso. Nós nascemos intactos, com o comer consciente. O bebê grita de fome, daí mama e fica satisfeito. E você não tem como obrigar um bebê satisfeito a comer mais.
G: Podemos comer de tudo para nos saciar então?
SD: A qualidade da comida é importante, não pode respeitar a fome com chocolate, por exemplo. Muitas pessoas entendem que pode comer qualquer coisa. E você até pode comer de tudo, mas não tudo de uma vez. Há momentos para comer, há momentos para brincar, trabalhar e por aí vai. O problema é que com a nossa correria do dia-a-dia acabamos esquecendo de nos alimentar ou comemos de pé, assistindo televisão. O que acontece é que perdemos o contato com o nosso corpo. Deveríamos voltar a ter uma rotina próxima à dos nossos avós.
G: Então podemos pensar na refeição a cada 3 horas?
SD: Comer de 3 em 3 horas não faz sentido para mim. Eu sou pesquisadora de neurociência do comportamento alimentar [e sei que] nossa fome não é tão sistemática assim, não somos robôs. Se você está de dieta, sim, vale a pena comer a cada 3h, pois você vai sentir fome. Mas se a pessoa que respeita a fome faz um café da manhã reforçado, por exemplo, não terá fome 3 horas depois. Caso ela se force, comerá sem fome, o que engorda.
G: O horário é totalmente livre, então?
SD:Eu sou muito de respeitar a fome sem horários rígidos. Mas aconselho nunca deixar passar 4 ou 5 horas sem comer. Para quem está muito perdido, indico fazer apenas café da manhã, almoço, lanche e jantar. E é exatamente o que nossos avós faziam. Paramos de fazer os hábitos de bom senso.