Pela sexta vez, o mundo de Antônio Tenório mergulhou em um turbilhão de aplausos e gritos exaltados de fãs admirados. O barulho, porém, nunca foi tão forte por uma medalha paralímpica, uma prata. Deste vez foi em casa, no Rio de Janeiro. Foi o último ato de uma lenda do esporte. O judoca não precisava enxergar para sentir uma torcida encantada na Arena Carioca 3. Ninguém precisava. Neste sábado, aos 45 anos, o paulista de São José do Rio Preto se despediu dos Jogos Paralímpicos da maneira como sempre sonhou: com uma prata na categoria até 100kg, com o sexto pódio em sua sexta participação, com um 100%.
"Deus preparou o que há de melhor para mim. Essa ideia de parar não está descartada. Vou até 2018. Depois sentarei com meu grupo de trabalho, e vamos avaliar se vou até Tóquio ou não. Se eu tiver condições de representar meu país bem, por que não estar em Tóquio? Essa medalha de prata mostra que hoje estou em condições. Essa medalha de prata me credencia para continuar e escolher o momento que vou parar", disse Tenório.
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Não poderia haver um adversário mais simbólico para a despedida de Tenório das Paralimpíadas. Foi justamente o sul-coreano Gwang-Geun Choi que interrompeu a sequência de quatro títulos seguidos do brasileiro (entre Atlanta 1996 e Pequim 2008) e foi campeão em Londres 2012, deixando a lenda do judô paralímpico com o bronze. A vitória por ippon do sul-coreano não diminuiu o brilho de Tenório, ovacionado pela torcida, consagrado como lenda por seus quatro ouros, uma prata e um bronze em Paralimpíadas.
Ainda não foi o adeus definitivo de Tenório, que pretende disputar o Mundial de 2018. Competir em Tóquio 2020 e tentar a sétima medalha, porém, está fora dos planos. Aos 45 anos, o precursor do judô paralímpico do Brasil conta os anos para o merecido descanso, para virar um torcedor ilustre de uma talentosa safra de jovens judocas brasileiros, que conta por exemplo com Alana Maldonado. Certamente vai deixar saudades e muitos fãs, que o reverenciam não apenas por suas conquistas nos tatames, mas também por ser uma inspiração fora dele.
Tenório descobriu o judô aos sete anos, quando ainda enxergava. Aos nove, começou a competir e não demorou muito a se destacar entre as crianças da sua categoria. Aos 13 anos, porém, o paulista sofreu o acidente que mudou a sua vida. O jovem judoca brincava com amigos quando teve o olho esquerdo atingido por uma semente de mamona, o que causou descolamento de retina e o deixou cego deste olho. Seis anos mais tarde, uma infecção no olho direito o deixou totalmente sem visão. Como já era atleta desde a infância, Tenório não teve muita dificuldade para se adaptar para o judô de cegos, o que, segundo o atleta, contribuiu para a longevidade da sua carreira.
Tenório se consolidou como um exemplo, primeiro para os judocas paralímpicos do Brasil e do mundo, como o romeno Alex Bologa, de 20 anos, bronze na Rio 2016. Foi além. Inspirou pessoas a persistirem e trabalharem duro pelos seus sonhos.
O CAMINHO PARA A SEXTA MEDALHA
O caminho de Tenório ao pódio começou no confronto com o alemão Oliver Upmann, que rapidamente foi superado por ippon. Nas quartas de final, a luta mais complicada e longa. O brasileiro precisou de mais de dez minutos e muita experiência para superar o britânico Christopher Skelley. Mais alto e 22 anos mais novo, o europeu acabou sendo superado no golden score por uma punição.
Na semifinal, Tenório mostrou que estava firme e dominou a luta contra Shirin Sharipov, atual vice-campeão mundial. O uzbeque teve o técnico expulso logo no primeiro minuto e ficou sempre atrás nas punições, mas o brasileiro ainda encontrou um golpe no último segundo para vencer por yuko.
Na final, o duelo dos últimos campeões paralímpicos. Dono dos títulos de Atlanta 1996, Sydney 2000, Atenas 2004 e Pequim 2008, Tenório encarou um adversário que carregava o status de atual campeão paralímpico e fez jus ao título. Choi dominou as ações desde o início da luta e conseguiu encaixar o golpe perfeito para o ippon e o bicampeonato. Tenório ficou com a prata para fechar com mais um pódio sua história em Paralimpíadas.
PRATA DE WILIANS
O Brasil ainda tinha uma terceira chance de ouro. Wilians de Araújo chegou à final enfileirando rivais. Número 1 do ranking mundial, o brasileiro se impôs nos confrontos rumo à final. Foi ippon sobre o iraquiano Garrah Albdoor na estreia. Na semifinal, mais um lindo ippon no cubano Yangaliny Jimenez em uma revanche do Parapan-Americanos de 2015 - o rival é o atual vice-campeão mundial. Só que na decisão foi a vez dele de ir ao chão. Em apenas dois segundos, Wilians sofreu o golpe e precisou se contentar com a prata.