Curta de Leonardo Amorim representa AL no Queer Lisboa, em Portugal

Filme alagoano terá estreia mundial no evento, que é considerado um dos principais festivais LGBTQIA+ do mundo

Um final de semana em uma casa de praia, com o mar limpando a vista e o calor acendendo desejos juvenis. É à beira-mar e nesse contexto tão tranquilo quanto tórrido que o cineasta alagoano Leonardo Amorim ambienta sua nova história, contada no curta-metragem Queima Minha Pele. O filme representa Alagoas no Festival de Cinema Queer Lisboa, que ocorre entre os dias 22 e 30 de setembro, em Portugal.

Gravado em meados do ano passado, em Maceió e Marechal Deodoro, a obra recebeu incentivo da Prefeitura de Maceió, por meio do Edital do Audiovisual - Maceió 2019, lançado pela FMAC e suplementado pelos arranjos regionais da Ancine, e é uma produção da Doce Fantasma, com codistribuição do Sebrae Alagoas. O curta de Leonardo Amorim é a primeira produção alagoana na seleção oficial do Queer Lisboa, que é considerado o mais importante festival de cinema com essa temática e é também o mais antigo da cidade lusitana.

No filme, Rodrigo ressente seu irmão mais novo, Júlio, que deseja Caio, o melhor amigo do irmão. É com essas sensações e vontades que o cineasta constrói a própria estética do desejo, entrelaçando personagens que se veem ilhados no paraíso, rodeados por sensualidade e violência. O trio de protagonistas é composto pelos atores Lucas Carvalho, Liev Volk e Luciano Pedro Jr.

Temática está presente em todas as obras do jovem diretor alagoano - Foto: Reprodução

Para o diretor Leonardo Amorim, o curta “foca na história das suas personagens e no atrito entre seus desejos para alcançar cenas que geram sensações únicas, que sejam interessantes de serem filmadas e vistas. Queima Minha Pele é um curta que entende o cinema como um choque de olhares, uma mescla entre a fantasia e a realidade pela perspectiva queer. É o tipo de filme que me interessa fazer.”

Queima Minha Pele conta com uma equipe composta majoritariamente por alagoanos, como Maysa Reis (assistente de direção), Renata Baracho (diretora de fotografia), Renah Berindelli (diretora de produção), Janderson Felipe (produção executiva), Leonardo Bulhões (som direto) e Laís Santos Araujo (montadora). A pernambucana Carlota Pereira assina a direção de arte.

QUEER LISBOA

Criado em 1997, o Queer Lisboa é o mais antigo festival de cinema da cidade. Ao longo dos seus 27 anos, o Festival consolidou sua reputação a nível internacional, sendo, neste momento, um dos festivais do gênero mais reconhecidos na Europa, pela qualidade da sua programação e atividades, bem como pelos convidados que a ele atrai.

Queer Lisboa é um dos mais importantes festivais lusitanos - Foto: Divulgação

A temática faz parte do universo criativo de Leonardo Amorim. O diretor, roteirista, montador e produtor cultural tem 25 anos e já realizou três curtas com recursos próprios: Porno (2016), A Noite Estava Fria (2017) e Vamos Ficar Sozinhas (2019). Integrou o Júri Jovem da 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Na curadoria, atuou nos episódios LGBTQIA+ do programa Lugar de Cinema, da TV Educativa, e na XIII Mostra Sururu de Cinema Alagoano. Atualmente, é diretor artístico e curador do festival de cinema queer Mostra Que Desejo e desenvolve seu primeiro longa-metragem: Ainda Te Vejo Caindo.

O artista conversou com a Gazeta de Alagoas, falou sobre a estreia do filme em Portugal e sua relação com a sétima arte. Além disso, Leonardo Amorim revisitou sua trajetória e revela referências e paixões.

Leonardo Amorim tem 25 anos e é diretor, roteirista, montador e produtor cultural - Foto: Marina Bonifácio

GAZETA DE ALAGOAS. Conta pra gente sobre a sua relação com cinema?

LEONARDO AMORIM. Desde a adolescência, eu decidi que iria fazer cinema. Numa época que estava me aprofundando, pesquisando mais filmes e a história do cinema, foi “Hiroshima, Meu Amor” (Alain Resnais, 1959) o responsável por me fazer escolher trabalhar com isso. Fiz meu primeiro curta em 2016, e, desde então, não parei de fazer projetos, produzir meus filmes, trabalhar nos filmes dos outros e no Mirante Cineclube [o cineasta integra o coletivo]. Não me vejo fazendo qualquer outra coisa.

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E como é fazer cinema em Alagoas?

Fazer cinema em Alagoas é um desafio pela falta de investimentos recorrentes no setor audiovisual. Houve um aumento nos últimos anos, especialmente pelo governo estadual, mas ainda não temos algo como um FUNCULTURA, que existe em Pernambuco, que garante que todo ano haverá investimento em todas as artes. A esperança é que com leis federais, como Paulo Gustavo e Aldir Blanc, possamos aproveitar e manter a recorrência a nível nacional.

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O seu novo trabalho é Queima Minha Pele. Nos fala um pouco sobre ele, como surgiu esse filme, do que ele trata?

Queima Minha Pele surgiu em 2018, quando tive uma primeira ideia sobre a história de dois irmãos, como a partir deles poderia refletir sobre branquitude e masculinidade. O filme mudou muito até ser filmado em 2022. Hoje, ele acompanha esses dois irmãos, Júlio e Rodrigo, em um final de semana em uma casa de praia. Rodrigo ressente seu irmão mais novo, Júlio, que deseja Caio, o melhor amigo de Rodrigo. Tanto ressentimento e desejo junto só pode gerar algo… intenso. Acho que é isso que consigo dizer sem estragar.

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E quais são suas referências no cinema?

São várias, mas me interessa filmes em que é perceptível um cuidado com a expressividade do som e da imagem. E isso não diz respeito a Ks de resolução. Vou citar apenas cinco realizadores: Carlos Reichenbach, Jacques Tourneur, Claire Denis, King Vidor e Rainer Werner Fassbinder.

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A temática queer está presente em outras obras suas. Qual sua relação com isso?

Todos os filmes que eu fiz até aqui lidam com sexualidade e desejo, especialmente focando em jovens LGBTQIA+. O que me interessa em um cinema queer é que não é somente sobre representatividade. É sobre como esse filme ousa formalmente, como ele incomoda a partir das imagens que traz e a maneira que as filma, como tem uma energia buscando ir além. Foi por isso, inclusive, que idealizei a Mostra Que Desejo, para trazer cinema Queer brasileiro para o público de Maceió. No fim de tudo, a questão é que se a principal força de um filme está em algo que poderia ser um slogan, em algo que um comercial de banco ou cerveja poderia fazer, não acho que é cinema.

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O filme está no Queer Lisboa, e é o primeiro de Alagoas nessa seleção. Como foi tudo isso para você?

Fiquei muito feliz em ser o primeiro filme alagoano a entrar no Queer Lisboa. Acho que estamos em um momento, enquanto setor, há alguns anos, em que ocorreram e ainda vão ocorrer vários “primeiros”. Consigo citar como exemplos o longa Cavalo, de Rafhael Barbosa e Werner Salles. Os curtas A Barca, de Nilton Resende, Trincheira, de Paulo Silver, Infantaria, de Lais Santos Araújo. O que devemos trabalhar é para garantir a continuação disso, não se contentar com esses “primeiros”. Existem muitas pessoas talentosas aqui, que só precisam de investimento para levar a arte alagoana para o mundo. O cinema alagoano não pode parar.

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E onde você quer chegar com o cinema? Que outros projetos podemos esperar?

Espero chegar em alguma forma de estabilidade, constantemente produzindo e trabalhando nos filmes dos outros. Ouso sonhar mais e desejo que isso possa ser feito aqui, com o devido investimento. Estou trabalhando em um longa-metragem, que espero financiar até o próximo ano, chamado Ainda Te Vejo Caindo. Além disso, outros projetos de curtas estão vindo.

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