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Governo de SP é condenado a indenizar família de travesti

Laura morreu após ser espancada por 5 rapazes, e PMs deixaram de socorrê-la

A Justiça de São Paulo condenou o governo estadual a pagar indenização de R$ 50 mil por danos morais aos pais da travesti Laura Vermont. Ela tinha 18 anos quando foi assassinada, em 15 de junho de 2015, por um grupo de rapazes. Eles a espancaram após discussão e briga na Zona Leste da capital. Os agressores são réus no processo de homicídio contra a vítima. Todos respondem ao crime em liberdade e aguardam a data do julgamento.

Em sua decisão, o juiz Kenichi Koyama, da 11ª Vara de Fazenda Pública do Foro Central, atendeu parcialmente o pedido de indenização feito pela Defensoria Pública e considerou que o estado foi omisso na morte de Laura. Segundo o magistrado, agentes públicos - policiais envolvidos no caso - foram negligentes, imprudentes e ainda mentiram. Eles, no entanto, não participaram do assassinato da travesti. Cabe recurso da sentença.

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Dois policiais militares que foram acionados para atender a ocorrência das agressões dos jovens a Laura se distraíram e permitiram que ela entrasse na viatura da Polícia Militar (PM), dirigindo o veículo até batê-lo num muro. Um dos PMs então a agrediu e o outro atirou no braço dela. Depois deixaram de socorrê-la. Em seguida, ambos deram uma versão fantasiosa na delegacia, omitindo tudo o o que aconteceu. Depois de serem confrontados pela Polícia Civil, os agentes acabaram contando a verdade.

"Indiscutível que a omissão estatal foi no momento da abordagem negligente com a situação, permitindo inclusive perder a viatura. Provavelmente por esse fato, tornou-se imprudente na abordagem, inclusive com disparo desnecessário de arma de fogo. Sucedeu-se que não atendeu a vítima para lhe salvar a vida, sem que haja qualquer elemento suficiente para supor que o atendimento não fosse exitoso se desde logo tivesse sido correta abordagem. E finalmente, foi dolosamente inaceitável alterar sua versão para escapar de uma realidade patética que causou", escreveu o juiz Kenichi em 4 de abril.

"Desse modo, fixo o dano moral em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), o que se dá compatível com a imprudência e imperícia da abordagem policial, de forma que o valor seja para mitigar os resquícios do prejuízo enfrentado pelo autor", informa outro trecho da decisão do magistrado.

O que dizem os citados

A decisão da Justiça de condenar o governo a indenizar a família de Laura só foi conhecida nesta semana pela Defensoria Pública. Em outubro do ano passado, o órgão havia entrado com uma ação na Justiça pedindo que o governo do estado de São Paulo pagasse indenização por danos morais de 4 mil salários mínimos (o equivalente a R$ 4,4 milhões) a Zilda Laurentino e Jackson de Araújo, pais de Laura.

Na mesma ação, a Defensoria também pediu o pagamento de uma pensão mensal por danos materiais à família até 2062, quando a vítima completaria 65 anos, se estivesse viva. O valor pedido foi de um salário mínimo (R$ 1.100). Laura contribuía com o pagamento das despesas da casa onde morava com os parentes. Os familiares tinham montado um salão de beleza para ela trabalhar como cabeleireira.

O juiz Kenichi negou, no entanto, o pedido de indenização por danos materiais contra o estado. Segundo ele, o motivo é o fato de que a travesti foi morta pelo grupo de rapazes e não pelos PMs.

"O dano material não pode ser aceito. A morte não foi causada direta e imediatamente pelo Estado. É uma concausa, mas sem elementos de suficiência", escreveu o magistrado.

Tanto a Defensoria quanto os pais de Laura informaram ao G1 que não aceitarão receber o valor de R$ 50 mil de indenização determinado pela Justiça, e, que, por esse motivo, irão recorrer da sentença. Eles também vão requerer novamente a condenação do governo estadual por danos materiais.

"O pedido de reparação dos danos morais foi julgado procedente, mas num valor bem abaixo do que pedimos", disse a defensora pública Renata Groetaers, que atua numa unidade da Defensoria na Fazenda Pública. "A primeira versão do recurso está pronta e sendo discutida com os núcleos especializados de Direitos Humanos e Diversidade Sexual [da Defensoria Pública]."

Segundo Renata, os defensores se reuniram e decidiram pedir os 4 mil salários mínimos de indenização por danos morais para os pais.

"Jamais aceitarei esse valor. Já pedi para recorrer", falou Zilda sobre os R$ 50 mil determinados pela Justiça de São Paulo. "Uma vida não tem preço. O importante para mim seria eu ter minha filha. Não tem dinheiro que pague a vida dela."

Procurada para comentar a decisão da Justiça em condenar o governo a pagar indenização à família de Laura, a assessoria de imprensa da Procuradoria Geral do Estado (PGE) de São Paulo, que defende os interesses do governo paulista, informou que "o caso está em análise" pelo órgão.

Transfobia

"Crimes como esse infelizmente continuam ocorrendo. Pessoas, membros, LGBTs, homossexuais, no caso dessa jovem, ela, por ser trans, foi totalmente espancada. Isso tem que acabar no Brasil. Isso é um crime de ódio", disse José Beraldo, advogado que representa os interesses da família de Laura.

A Polícia Civil, que investigou o caso, descartou, porém, a possibilidade de o assassinato contra Laura e a agressão dos PMs diante da travesti terem sido motivados por transfobia. E concluiu que Laura morreu em razão dos ferimentos e das lesões causadas pelos cinco rapazes antes da abordagem policial. Descartando, assim, a participação dos PMs no homicídio, mesmo eles tendo agredido e atirado nela depois que apanhou dos jovens.

Segundo os agentes da Polícia Militar, Laura roubou o veículo da corporação. Advogados que defendem os interesses da família de travesti contestaram essa versão. Eles alegaram que a vítima pegou o carro da corporação para fugir dos jovens agressores.

Os agentes chegaram a ser presos por darem depoimentos falsos à Polícia Civil. Depois, foram soltos.

Por meio de nota, a Polícia Militar informou que os policiais foram exonerados em 2016 em razão das falhas que cometeram no caso de Laura. O soldado Diego Clemente Mendes, de 23 anos, atirou no braço da travesti. Ele e o sargento Ailton de Jesus, de 44 anos, também deixaram de socorrer a vítima. Ambos alegaram à época que agiram para se defender de Laura.

De acordo com a Justiça, Laura morreu ainda na Avenida Nordestina, antes de ser socorrida pelos próprios familiares dela e levada ao hospital. Mas o atestado de óbito informa que ela faleceu na unidade médica. Segundo o laudo do Instituto Médico Legal (IML), a causa da morte foi traumatismo craniano em decorrência das agressões que sofreu dos rapazes. A vítima recebeu socos e pauladas na cabeça.

O prefeito Fernando Haddad participa da inauguração do Centro de Cidadania LGBT Leste 'Laura Vermont' e da Unidade Móvel de Cidadania LGBT Leste na Avenida Nordestina em São Miguel Paulista, São Paulo
O prefeito Fernando Haddad participa da inauguração do Centro de Cidadania LGBT Leste 'Laura Vermont' e da Unidade Móvel de Cidadania LGBT Leste na Avenida Nordestina em São Miguel Paulista, São Paulo | Foto: Peter Leone/Futura Press/Estadão Conteúdo

Réus e vídeos

Câmeras de segurança de uma padaria gravaram as agressões e ajudaram a polícia a identificar os outros jovens. As imagens circularam nas redes sociais à época.

Os rapazes chegaram a ser presos em 2015, mas atualmente respondem ao assassinato em liberdade.

Van Basten Bizarrias de Deus, de 29 anos; Iago Bizarrias de Deus, de 27; Jefferson Rodrigues Paulo, de 29; Bruno Rodrigues de Oliveira e Wilson de Jesus Marcolino, de 25, são acusados de homicídio doloso (intencional) contra Laura Vermont. Além de amigos, alguns dos cinco réus são parentes.

Eles aguardam a Justiça marcar uma data para o julgamento. O júri popular já foi adiado duas vezes. Deveria ter ocorrido em setembro de 2019 e, depois, em março de 2020. Produção de mais provas e pandemia de coronavírus foram os motivos dos adiamentos.

Sete jurados irão decidir se absolvem ou condenam os réus pelo crime. A pena para homicídio pode chegar a 30 anos de prisão.

Até a última atualização desta reportagem, a Justiça ainda não havia marcado o julgamento, que tem de ser presencial, segundo o rito processual.

Outro vídeo mostra Laura caminhando com o rosto ensanguentado. O funcionário do posto que gravou as imagens com o celular pergunta: “O que foi?” A vítima responde e pede ajuda: “Você sabe como é que é. Você me leva para o pronto-atendimento?”

Essa filmagem teria sido feita momentos antes de Laura pegar a viatura dos dois policiais militares que atenderam a ocorrência.

O G1 não conseguiu localizar as defesas dos rapazes e dos PMs para comentarem o assunto até a última atualização desta reportagem.

O assassinato provocou a reação de travestis nas redes sociais. A repercussão foi tamanha que, em julho de 2016, a prefeitura inaugurou o Centro de Cidadania LGBT Laura Vermont em homenagem a Laura. O local fica na mesma via em que ela foi agredida, a Avenida Nordestina, em São Miguel Paulista.

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