Pioneiro a ter uma legislação exclusiva voltada à proteção da infância e adolescência, o Brasil celebra, neste sábado (13), os 34 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente. Instituído pelo então Presidente Collor, o ECA se tornou referência mundial e, até hoje, reflete um avanço fundamental ao superar a antiga doutrina da situação irregular, que via crianças e adolescentes em situações de vulnerabilidade apenas como objetos de intervenção do Estado, sem reconhecimento pleno de seus direitos.
O Estatuto ratificou tratados internacionais da época, como a Declaração Universal dos Direitos da Criança e do Adolescente e a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas (ONU).
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A partir da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, o ECA passou a reconhecer oficialmente crianças até 12 anos incompletos e adolescentes entre 12 e 18 anos como sujeitos de direitos, com prioridade absoluta em seus direitos. Também fortaleceu o papel da família, da sociedade e do Estado na proteção e no desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.
A ideia de Collor, ao sancionar a lei, era transformar a criança numa prioridade nacional, numa articulação entre o Estado brasileiro, a sociedade e as famílias. Diante de mais de três décadas do conjunto de leis, o ex-presidente celebra os dispositivos do ECA, reconhecendo no estatuto um poderoso instrumento da mudança, que está ao alcance dos legisladores.
“Já aprendemos - acredito que todos - que a inação, a negligência e a desídia para com a infância e a juventude nos cobram um preço elevado demais. Para os jovens que já estão nas ruas ou em situação de vulnerabilidade social, não nos resta alternativa senão a educação. Para evitar que se envolvam com o crime, é preciso inseri-los na sociedade, socializá-los. É preciso aproveitar a pouca idade que têm e oferecer-lhes perspectivas, uma razão para viver. É preciso acenar-lhes com um futuro. É preciso mostrar-lhes, pela primeira vez em suas vidas, a face acolhedora do Estado. É preciso conquistá-los”, reforçou Collor.
Para a advogada e presidente da Comissão de Direito da Criança e do Adolescente da OAB-AL, Mariana Sampaio, o Estatuto trouxe uma série de direitos e garantias fundamentais para a população infanto-adolescente, estabelecendo uma base legal sólida para a promoção e proteção de seus direitos.
“Entre as inovações relevantes estão a obrigatoriedade de implantação dos Conselhos de Direitos, órgãos com formação paritária entre representantes do poder público e da sociedade civil, que possuem caráter deliberativo, controlador e fiscalizador das políticas públicas ligadas à infância e adolescência. Além disso, o direito à participação conferido a toda criança e adolescente, permitindo-lhes participar de qualquer ato relacionado às suas vidas, foi um marco importante no campo normativo”, destacou.
Na avaliação da advogada Ruthiléia Barbosa, vice-presidente da Comissão de Direito da Criança e do Adolescente da OAB-AL, durante esses 34 anos, a lei também passou por modificações para se adaptar cada vez mais à realidade e às necessidades das crianças e adolescentes.
“É necessário ainda avançar bastante para que tudo o que está proposto no campo legal se traduza em políticas públicas e ações afirmativas de garantia de direitos. Esse continua sendo o grande desafio de todos nós”, ressaltou.
O promotor Gustavo Arns, da 13ª Promotoria de Justiça da Capital, compreende que o ECA promove a adoção do princípio da proteção integral, que reconhece crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, com prioridade absoluta na formulação e implementação de políticas públicas.
“Um dos pilares do ECA é a criação dos Conselhos Tutelares, órgãos permanentes e autônomos encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. Esses conselhos atuam de forma descentralizada, permitindo uma abordagem mais próxima e eficiente na solução de problemas e na proteção dos direitos infantojuvenis. Os Conselhos Tutelares são essenciais para a fiscalização e aplicação das políticas públicas, funcionando como um canal direto entre a comunidade e o poder público”, analisa.
E frisa que o Ministério Público tem a responsabilidade de fiscalizar a execução das políticas públicas, promover ações judiciais e extrajudiciais para garantir o cumprimento dos direitos estabelecidos no estatuto e intervir em processos que envolvam interesses de menores de idade.
Gustavo Arns entende que a plena eficácia do ECA depende de ações concretas. “É essencial que os gestores públicos estejam comprometidos com a causa e atuem de forma proativa para a criação de políticas públicas inclusivas e eficazes, que respeitem e promovam os direitos das crianças e adolescentes”.
Para o conselheiro tutelar Neemias Silva, nas últimas três décadas em que esteve vigente, o ECA introduziu marcos importantes.
“Destaco aqui as últimas introduções, com a Lei da Escuta Protegida e Depoimento Especial, que protege a criança ou adolescente vítima de violência de ser revitimizada, e a Lei Henri Borel no Estatuto, dando ao Conselho Tutelar a prerrogativa de requerer do Poder Judiciário a concessão de medida protetiva de urgência, nos casos de violência doméstica”.