A pequena enseada branca de seixos do grande rio é sempre para mim esplendorosa e brilhante, meu lugar de repouso, de espera da visão.
Meu cavalo Appaloosa pasta perto de mim, aproveitando as ramagens dos abetos que ainda têm folhas. O inverno esse ano reluta em se instalar, as águas do rio continuam caudalosas e frias.
Meu cão corre entre as árvores.
Armo minha tenda de pele de búfalo, e espero sentada e calma que a visão venha me visitar, ou que um dos animais do meu totem, venha até a mim.
Sinto em meu espírito que essa não é minha primeira jornada a procura do grande Mistério. Já empreendi outras, em outras eras, outras paisagens, locais em que o Grande Mistério tinha outros nomes e outras faces. No entanto, a procura e a Visão são as mesmas. As respostas, quem sabe , serão diferentes, porque guardam as perspectivas de outras eras e quem sabe, outras dimensões.
Quando era apenas uma mocinha fui ao alto das montanhas para minha primeira viagem iniciática, não fazia ideia dos sacrifícios e das abstenções que acompanham a Visão, o vislumbre do Mistério, e das responsabilidades que o Poder confere e exige de quem ousa a se apropriar dele. Mesmo eu, que nasci com o Dom, descoberto pela avó de minha mãe, qdo ainda estava eu em seu ventre.
Desde criança já sabia o segredo das ervas, quais eram as úteis para cura de várias enfermidades.
Ao entrar na tenda vermelha, fui iniciada nos segredos da concepção e do parto.
Muito cedo amansei meu potro selvagem e corri até os Confins de nosso território. Aprendi a me fazer invisível e conversar com o vento, apesar de todas essas habilidades , tenho de cumprir todos os decretos e não me afastar deles. Caso contrário estarei perdida para sempre.
Pesco com meu pequeno arpão um peixe que divido com meu cão, do qual não posso pronunciar o nome, porque ele pertence ao meu totem.
Aguardo a noite chegar.
A manta de bisão me protege do frio. A águia rasga a noite com seu voo silencioso, observo e agradeço sua mensagem. Rasteja a serpente entre meus pés, a formiga adiante leva uma pequena folha. Um lobo uiva chamando a matilha.
Passa a raposa e me olha de frente, quase um desafio, mas vai devagar se afastando.
No céu a Ursa Maior pisca, e alguns clarões azulados respondem á voz do trovão ao longe.
Entro, fecho a cabana, espero o sonho revelador. Una com a Terra, sou herdeira do Universo…
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Yaradir de Albuquerque Sarmento
É sócia efetiva da AAL, ocupa a cadeira 14 desde 2015 publicou o primeiro livro em 2013: versos sem reverso - editor Benedito Ramos Amorim, no ano seguinte publicou outro livro de poemas: Maquinações Poéticas com o mesmo editor e logo em seguida o romance: Sonho de Uma Noite na Índia lançado sob a edição de Benedito Ramos Amorim no ano 2016. O nascimento de vênus livro de poemas publicado em 2019 - editora CBA. em 2021- editora Viva - Um Jeito Feminino de Ser Crônicas e Contas. 2021 - editora Viva - Camaleoa - Romance 2023- editora Viva - Poemas Esquecidos - aguardando lançado. Pintora autodidata fez duas exposições no MISA - 2014 e 2019. Uma exposição coletiva no parque shopping. Sua pintura é espontânea, tem traços de impressionismo, no entanto as cores são sua paixão e desafio, flores e mulheres místicas são seu tema favorito. Quer através da pintura resgatar o divino no feminino, a deusa geratrix que impulsiona a humanidade para a procura do bem e o belo, tanto externamente na natureza que nos cerca quanto interna na força do espírito que constrói e eleva o homem aos páramos dos deuses.